25.5.25

“Jurado Nº 2” - Clint Eastwood (EUA, 2024)

Sinopse:
Justin Kemp (Nicholas Hoult) é um pai de família que serve como jurado em um importante julgamento de assassinato. Ele se depara com um dilema moral significativo que pode influenciar o veredito do júri, potencialmente condenando ou absolvendo o réu acusado de homicídio.
Comentário: Clint Eastwood (1930) é um diretor e ator americano de quem já assisti 20 títulos, dentre eles a obra-prima “Os Imperdoáveis” (1992) e os ótimos “O Estranho Sem Nome” (1973), “As Pontes de Madison” (1995), “Sobre Meninos e Lobos” (2003), “Menina de Ouro” (2004), “Cartas de Iwo Jima” (2006) e “A Conquista da Honra” (2006). Desta vez vou conferir “Jurado Nº 2” (2024).
Luiz Joaquim do site Cinema Escrito nos conta que “Clint Eastwood, 94 anos, volta às luzes do mundo, e o ilumina mais uma vez, nos intrigando com o seu mais recente trabalho (será o último?): ‘Jurado #2’, (...) [um filme com] o habitual contraste entre o certo e o errado, entre o justo e o injusto que tanto marca sua filmografia, e não apenas como diretor. E o melhor, sem arroubos ou gorduras. Entregando ao espectador médio de maneira fácil um conflito profundo para ele próprio decidir que lado tomar a partir de dados simples, quase corriqueiros. Daqueles dignos de representar qualquer cidadão comum.
Para entender, basta saber pouco do enredo. Temos o jovem e feliz Justin (Nicholas Hoult) com a sua esposa Allison (Zoey Deutch) prestes a dar à luz a primeira filha do casal. Enquanto isso, Justin, a contragosto, foi escolhido para compor um júri de 12 integrantes civis – entre eles o ex-policial Harold (J. K. Simmons) – para um julgamento de assassinato. O acusado James (Gabriel Basso) vai a julgamento pela suspeita de ter assassinado sua namorada jogando-a de uma ponte. Há inclusive uma testemunha ocular que confirma ter visto James empurrando-a. Tudo aponta para um óbvio veredito: culpado! Mas acontece que, durante o julgamento, Justin se dá conta que James é inocente por uma informação que apenas Justin possui. O ponto é: após consultar seu pastor e também advogado, Larry (Kiefer Sutherland), Justin compreende que compartilhar com o júri essa informação para inocentar James comprometeria toda a sua vida e a de sua esposa e filha.
Está dado o dilema, e ele não é pequeno. Nunca foi para Eastwood. Tanto que em ‘Jurado #2’, os aspectos legais e formais do julgamento, com o advogado de defesa Eric (Chris Messina) e com a promotora Faith (Toni Collette), desfiando suas provas e argumentos, não toma metade do filme. O interesse de Eastwood aqui, nesse belo roteiro original de Jonathan A. Abrams, está nas discussões dos 12 integrantes do júri. Está no exercício rebolativo de Justin em convencer quase a totalidade de seus colegas no júri, convictos na culpa de James, que o acusado é inocente. Mas isso sem revelar a sua informação privilegiada.
Com fotografia de Yves Bélanger, é muito bom perceber não apenas um padrão temático de Eastwood no seu ‘Jurado #2’ mas também estético. Desde um simples plano contra-plongée de dentro do carro da advogada de acusação (típico em seus filmes policiais), até o velho e bom plano do protagonista Justin chorando desamparado dentro de seu carro sob a chuva, com o enquadramento por fora do carro, mostrando filetes d’água da chuva escorrendo pelo para-brisa e ampliando poeticamente a sua angústia. Em ‘Menina de Ouro’, só para citar um de seus filmes com o recurso, a mesma situação ocorre com Maggie (Hilary Swank).
Colocar ‘Jurado #2’ diante de uma boa parte da gigante filmografia de Eastwood é também confrontar uma de suas maiores marcas. O cuidado com a lei, mas a necessidade de quebrá-la para estabelecer a justiça aos olhos do protagonista. O crítico Fernando Ganzo lembrou bem na Cahiers du Cinèma (...) que o link recente e imediato para ‘Jurado #2’ é ‘O Caso Richard Jewell’ (2018), uma vez que ‘não existe uma só forma de estabelecer justiça, seja pelo que nos é dado no aparente ou não, seja condenando monstros ou santificando heróis’. Por essa diretriz, Eastwood nos põe no novo filme de fronte a um contexto em que não podemos acusar ninguém - afinal, todos são vítimas: Justin, James e a sua falecida namorada -, mas temos, espectadores, que concordar que há uma responsabilidade moral que precisa ser contemplada. E isto tem um preço alto.
Interessante que, ao final, ‘Jurado #2’, nos dá um tapa na cara. Nos dois lados da cara. Tanto na nossa face que nos faz torcer pelo bom rapaz protagonista, Justin – ‘pai da ideal família americana’ - quanto na nossa face que sempre caminhou pelas trilhas da justiça a la Eastwood ‘Make my Day!’. Temos, enfim, a desconstrução do seu herói clássico - aquele que buscava por todos os meios a salvação. Isto porque é a lei que irá se impor aqui, ao fim e ao cabo. Num final aberto, mas com o rosto duro da promotora chamada Faith (Fé, em português) dando a eloquência das consequências de se encarar a verdade: a única e autêntica ferramenta da justiça”.
O que disse a crítica: Ty Burr do site Washington Post avaliou com 2,5 estrelas, ou seja, regular. Disse: “Eastwood nunca foi um cineasta de estilo, e esse filme em particular tem a enfadonha e proficiente clareza de um filme feito para TV. Ainda assim, ‘Jurado No. 2’ contém a experiente sabedoria de um artista indo de uma contemplação sobre como a sociedade falha com quem chama de heróis para uma reflexão sobre as maneiras que um homem pode simplesmente falhar consigo mesmo”.
Sérgio Alpendre da Folha SP avaliou com 5 estrelas, obra-prima. Escreveu: “Como um mestre, em ‘Jurado Nº 2’ Eastwood encaminha o drama para um desfecho surpreendente, dos mais brilhantes de sua brilhante carreira. Sem saídas fáceis, nem apaziguamento do espectador”.
O que eu achei: Sempre que é lançado um filme do Clint Eastwood eu gosto de ver pois, apesar do machismo e de um tanto de nacionalismo nas suas produções, o cara é um cineasta – e também um ator - a se respeitar, que sabe como contar uma história. Um bom representante do clássico cinema americano. Este “Jurado Nº 2” foi rodado recentemente, com o cineasta com 94 anos de idade. Então você se pergunta: será que ele ainda dá conta de uma empreitada como essa? Com uma distribuição bem comprometida, estreando apenas em 50 salas nos EUA e em poucas salas na Europa, o filme foi diretamente para o streaming. Essa decisão da Warner foi interpretada como um boicote devido às opiniões políticas de Eastwood, que não são bem vistas pelos executivos do estúdio. Uma pena pois se como profissional ele já mereceria um pouco mais de respeito, o filme em si também mereceria como produto, pois é um filme e tanto. Se você vê o trailer você pensa que já sabe tudo sobre a trama, mas que nada, o buraco é mais embaixo e a moralidade dos homens - em especial de dois personagens - vai sendo colocada em cheque, enveredando na investigação de papéis sociais, bases ideológicas, verdades e mentiras. Sem diminuir a capacidade do espectador, o desfecho surpreende, colocando esses dois personagens cara a cara: afinal a quem interessa a justiça? O longa parece inspirado por “12 Homens e uma Sentença” (1957) de Sidney Lumet; Nicholas Holt está gigante no papel do jurado de número 2, o personagem principal; e a direção de Clint Eastwood continua sim em plena forma. Filmaço!