Sinopse: Os cinco torturadores mais cruéis da ditadura de Pinochet - Manuel Contreras (Hugo Medina), Miguel Krassnoff (Bastián Bodenhöfer), Odlanier Mena (Alejandro Trejo), Marcelo Moren Brito (Mauricio Pesutic) e Pedro Espinoza (Óscar Hernández) - cumprem penas, que somam séculos, em uma luxuosa prisão aos pés da cordilheira
dos Andes. O local possui piscina, jardins e aviários, e os presos são vigiados
por guardas que mais parecem empregados. Quando uma equipe de televisão
entrevista um dos internos, as declarações desse homem têm um impacto
inesperado. Temendo uma transferência para um presídio comum, os militares condenados
farão o possível para permanecer no local.
Comentário: Felipe Carmona é um cineasta chileno, roteirista, montador e
diretor de cinema e TV. Ele realizou, dentre outros, os curtas-metragens
“William Shakespeare’s Dream in Constantinople” (2013) e “Los Camarones Tienen
el Corazón en la Cabeza” (2014). “Prisão nos Andes” é seu primeiro
longa-metragem.
Camilla Almeida do site G1 nos conta que “A narrativa aborda
um episódio político marcante da redemocratização do Chile, que teve início em
1990, após o fim de um dos períodos mais violentos de sua história:
a ditadura de Augusto Pinochet, que começou em 11 de setembro de
1973 e durou até 11 de março de 1990.
Exibido em diversos festivais pelo mundo, como o Festival de
Londres, a Mostra de São Paulo e o Festival de Cinema Latino de Chicago, ‘Prisão
nos Andes’ se passa em 2013, e segue a história de cinco dos generais mais
influentes do regime militar. Eles cumprem penas que somam séculos em uma
prisão situada na Cordilheira dos Andes. O presídio mais se assemelha a
uma mansão: conta com piscina, jardins e acesso a itens luxuosos vindos do
exterior. Além disso, os prisioneiros são vigiados por guardas que, na prática,
desempenham funções semelhantes às de empregados e mordomos.
O cenário de comodidade é perturbado quando os prisioneiros
recebem uma proposta de entrevista para um canal de TV, e um deles aceita. As
declarações polêmicas desencadeiam uma onda de insatisfação da população, que
pede a transferência dos torturadores para prisões comuns. Temendo a
perda de seus privilégios, os militares passam a elaborar um plano junto aos
guardas penitenciários para garantir que eles fiquem onde estão.
O roteiro é inspirado em um caso real. O título
original em espanhol, ‘Penal Cordillera’, faz referência aos eventos ocorridos
no Centro de Cumprimento Penitenciário da Cordilheira, também em 2013, quando o
ex-presidente Sebastián Piñera anunciou o fechamento desse presídio. Inaugurado
em 2004, o local foi criado para abrigar militares envolvidos em violações
de direitos humanos durante a ditadura, além de ajudar a aliviar a superlotação
do presídio de Punta Peuco. A prisão, gerida pela Guarda Prisional Chilena,
ficava em um antigo complexo recreativo do Comando de Telecomunicações.
O grupo de detentos incluía Manuel Contreras (Hugo Medina),
braço direito de Pinochet e ex-chefe da Dirección de Inteligencia Nacional
(DINA), a polícia secreta chilena; Miguel Krassnoff (Bastián Bodenhöfer), um
dos principais responsáveis pelo centro de tortura Villa Grimaldi; Odlanier
Mena (Alejandro Trejo), ex-diretor da Central Nacional de Informaciones (CNI),
outra agência de inteligência do Chile; Marcelo Moren Brito (Mauricio Pesutic),
ex-chefe de operações da DINA e da Villa Grimaldi; e Pedro Espinoza (Óscar
Hernández), brigadeiro da aeronáutica.
De acordo com Felipe Carmona, a ideia do roteiro surgiu a
partir de uma curiosidade pessoal: o que se passava na cabeça dos oficiais
nesse momento? Como era o relacionamento entre os condenados? ‘Achei fascinante
imaginar como seria a vida desses cinco torturadores, digamos, vivendo
confinados aos pés da montanha’, disse o diretor, em entrevista exclusiva
à Revista Galileu. ‘Ao filmar esses personagens, além dos nomes reais, o
objetivo era retratar o poder e o mal, encerrados nos Andes. Poderiam ser
empresários corruptos, constituintes, militares; [não importa quem fosse] o
filme contaria a mesma história’.
Os cinco protagonistas foram condenados por crimes
contra a humanidade e sentenciados a centenas de anos de prisão. A maioria
dos oficiais esteve envolvida na Caravana da Morte, um violento episódio
ocorrido logo após o golpe de Estado de Pinochet em 1973. Eles fizeram parte de
um esquadrão militar que, segundo a ONG Memoria y Justicia, executou 97 pessoas
que estavam sob custódia do Exército na época, incluindo jornalistas e
opositores do regime. Seus crimes também envolvem perseguição política,
apagamento de arquivos e sequestro.
No caso "Penal Cordillera", foi Manuel Contreras
quem desencadeou a polêmica que tomou conta da mídia chilena. A prisão oferecia
aos detentos diversos privilégios, como jantares com muitos convidados, acesso
à televisão, uma quadra de tênis e visitas duas vezes por semana, o que gerou
revolta na população do Chile. Apesar dos recursos e apelos dos ex-oficiais,
sua transferência foi aprovada pelo então presidente Sebastián Piñera para o
presídio de Punta Peuco em 28 de agosto de 2013.
Parte da equipe de atores sofreu com as violências da
ditadura de Pinochet, seja por tortura ou pelo exílio. ‘Quando convoquei
os atores, sabia um pouco sobre suas biografias. Sabia que alguns haviam
sido torturados, detidos por dois anos, exilados. Que haviam perdido
amigos próximos, assassinados’, contou o diretor. (...) Carmona acredita que as vivências dos atores contribuíram
significativamente para o resultado final do filme, que envolve o público em
diálogos íntimos e carregados de significados pessoais. O longa provoca uma
reflexão profunda sobre os limites que o ser humano é capaz de ultrapassar para
preservar seus privilégios e como a sensação de perda de poder pode gerar medo,
levando a atitudes descontroladas e violentas. Além disso, ele também discute a
manutenção das estruturas de poder, mesmo após o processo de redemocratização.
O filme enfrentou vários desafios durante sua produção.
Sendo uma coprodução entre Brasil e Chile, mesmo após ser aprovado em um edital
internacional em 2019, ‘Prisão nos Andes’ demorou a receber os
recursos da Agência Nacional do Cinema (Ancine), que deveria cobrir 20% do
orçamento. (...)
‘Eu dizia há pouco para um colega: parece que, após 50
anos, uma ferida dessas deveria estar cicatrizada. Uma sociedade que avança,
que segue adiante com os pilares democráticos ou os valores democráticos como
bandeira’, reflete Carmona. ‘Mas parece que não. Aos 50 anos, pelo menos no
Chile, parece que o pinochetismo e o negacionismo sobre o que ocorreu
na ditadura ressurgiram’.
Em 2023, uma pesquisa feita pelo Centro de Estudos Públicos
(CEP) do Chile revelou que o Partido Republicano, fundado em 2019 e de extrema
direita, é o mais popular entre os chilenos. Sob a liderança de José
Antonio Kast, que alcançou o segundo turno nas eleições presidenciais de 2021,
o partido defende fortemente que a imigração irregular é a principal
responsável pela crise de criminalidade enfrentada pelo país, além de
promover discurso anticomunista e militarista.
Sobre a importância das obras que abordam os regimes
antidemocráticos na América Latina, Carmona ressalta que é essencial relembrar
a memória histórica para garantir que eventos semelhantes não se repitam. ‘Filmar
e buscar novas formas de contar essa história é necessário, porque parece que a
memória, hoje em dia, pode ser apagada, e qualquer um pode negar os fatos, e há
pessoas que acreditam nisso’, relata. ‘Talvez o filme trate disso também: desse
monstro invisível que vota em candidatos como Milei [presidente da
Argentina], ou na extrema direita no Chile. Ele, talvez, não se mostre
diretamente, mas está lá, infiltrado nas famílias, no social, no trabalho, e
isso me parece muito perigoso’.
O que disse a crítica: Alexandre Cunha do site O Grito! Avaliou com 3 estrelas, ou
seja, bom. Disse: “A narrativa é certeira ao imprimir, desde o início, o tom de
escárnio e de ironia ao absurdo espetáculo que testemunhamos. A trilha sonora,
propositalmente alegre e leve, potencializa o sarcasmo adotado pelo diretor
para contar a história. Carmona também é feliz ao adotar uma fotografia
marcante, na qual os ambientes interiores são mergulhados em escuridão e
sombras, enquanto as cenas externas brincam com a opressão da natureza em volta
de lugar tão isolado. A sensação é de que aquele presídio existe em outro ‘plano’,
fora do mundo real. Agradam-me muito as passagens do filme nas quais os
generais expõem suas ideologias trôpegas, fincadas no moralismo mofado dos
defensores da pátria e da família. Entretanto, quando o roteiro dá destaque aos
personagens dos soldados que vigiam a prisão, o filme despenca em um drama
novelesco, extremamente frágil. Absolutamente sem relevância narrativa, o filme
apresenta um romance homoafetivo, às escondidas, entre dois guardas do local.
Este elemento não contribui para proximidade ou identificação do espectador com
o personagem Navarrete (Andrew Bargsted); não há desenvolvimento sobre a
história e soa apenas como tentativa falha de criar suspense”.
Roger Lerina do site Matinal avaliou com 5 estrelas, ou
seja, obra-prima. Escreveu: “Além das ótimas atuações do quinteto principal de
atores, ‘Prisão nos Andes’ destaca-se também por qualidades técnicas
como fotografia, direção de arte e trilha sonora ⎯ assinada pela brasileira Mariá Portugal. Felipe Carmona impressiona pela segurança narrativa
e densidade dramática de seu promissor primeiro filme, abordando com destemor e
sensibilidade temas complexos como trauma coletivo, reparação histórica,
naturalização da violência e masculinidade destrutiva”.
O que eu achei: Que tema interessante! Não me recordo de ter assistido nada nessa linha e esse foi o motivo que me fez querer ver esse primeiro longa do diretor Felipe Carmona. Olhem só que boa ideia: Carmona fez o roteiro em cima de um fato real ocorrido no Chile quando cinco militares foram julgados e sentenciados a centenas de anos de prisão por crimes contra a humanidade. Essas cinco figuras eram Manuel Contreras (braço direito de Pinochet e ex-chefe da polícia secreta chilena), Miguel Krassnoff (um dos principais responsáveis pelo centro de tortura Villa Grimaldi), Odlanier Mena (ex-diretor de uma agência de inteligência do Chile), Marcelo Moren Brito (ex-chefe de operações da DINA e da Villa Grimaldi) e Pedro Espinoza (um brigadeiro da aeronáutica). A maioria desses caras estava envolvida na Caravana da Morte, um violento episódio ocorrido logo após o golpe de Estado de Pinochet em 1973, que executou 97 pessoas que estavam sob custódia do Exército na época, incluindo jornalistas e opositores do regime. Além de estarem envolvidos em crimes de perseguição política, apagamento de arquivos e sequestro. Após condenados essa trupe foi mandada não para um presídio comum, mas sim para o Centro de Cumprimento Penitenciário da Cordilheira, uma prisão que mais parecia um spa aos pés da Cordilheira dos Andes, com os guardas funcionando mais como empregados deles do que como vigias da penitenciária. O que ocorre é que um desses militares - o Manuel Contreras - resolveu conceder uma entrevista para a tv e esse luxo ostentação foi parar nos jornais revoltando toda a população chilena que acabou exigindo que aquela unidade prisional fosse fechada e que eles fossem transferidos para um presídio comum, e assim o fez o presidente em exercício Sebastián Piñera em agosto de 2013. Então, só pela temática, é um filme que já vale ser visto, independentemente dos tropeços do diretor novato ou mesmo da história paralela de pouca relevância que ele mostra junto com essa. O final, apesar de abrupto, mostra que nem sempre crimes são punidos e que o fantasma de Pinochet ainda paira sobre o Chile, assim como ocorre aqui no Brasil, com milhares de pessoas querendo a volta desse regime nefasto e cruel. Em tempos de prisão de um General como Braga Neto, detido por tentativa de obstrução à Justiça, vale saber que ele se encontra atualmente na chamada “prisão especial”, uma prerrogativa dos militares antes da condenação definitiva, com direito à armário, geladeira, ar-condicionado, televisão e banheiro exclusivo, além de quatro refeições por dia feitas no rancho, o restaurante onde os oficiais de patentes mais altas comem. O filme novíssimo (2023) está disponível gratuitamente no site do SESC Digital. Como filme, até poderia ser melhor elaborado, mas como informação, é imperdível. Se jogue antes que saia do ar.