20.10.24

“Saudosa Maloca” - Pedro Serrano (Brasil, 2023)

Sinopse:
Numa mesa de bar, o velho Adoniran Barbosa (Paulo Miklos) conta a um jovem garçom (Sidney Santiago) histórias de uma São Paulo que já não existe. Lembra com carinho da maloca onde viveu com Joca (Gustavo Machado) e Matogrosso (Gero Camilo), da paixão deles por Iracema (Leilah Moreno) e de outros personagens eternizados em seus sambas, crônicas de uma metrópole engolida pelo apetite voraz do “pogréssio”.
Comentário: Pedro Serrano (1987) é formado em publicidade e especializado em direção de atores. Dirigiu, entre outros, o curta-metragem “Dá Licença de Contar” (2015) e os longas documentais “Luto em Luta” (2012) e “Adoniran - Meu Nome É João Rubinato” (2018). “Saudosa Maloca” é seu primeiro longa de ficção.
Para sabermos um pouco mais sobre quem foi Adoniran Barbosa (1912-1982), Tessi Ferreira do site do Centro Cultural São Paulo nos conta que seu nome verdadeiro era “João Rubinato, [ele] foi um icônico sambista paulista que deixou sua marca e revolucionou a cena do samba nacional entre os anos 50 e 80. Filho de uma família pobre, antes de se dedicar a música, Adoniran exerceu diversas profissões e morou em diferentes localidades da cidade e do estado de São Paulo. Além de sambista, também destacou-se como radioator no programa ‘Histórias das Malocas’, uma radiopeça escrita por Osvaldo Moles”.
Ele escreveu inúmeras músicas de sucesso. No filme ele interpreta “Trem das Onze”, “Um Samba do Bixiga”, “Samba Italiano”, “Conselho de Mulher”, “No Morro da Casa Verde”, “Vila Esperança”, ”Abrigo de Vagabundo”, “Iracema” e obviamente “Saudosa Maloca”, que dá título ao filme. Além de outras que não são de sua autoria.
“Além da qualidade musical e técnica impecáveis de seus arranjos, as letras dessas canções nos revelam a realidade crua da cidade de São Paulo na época, colocando em evidência as dificuldades enfrentadas pelo povo pobre que tentava sobreviver na metrópole que se erguia luxuosa e rapidamente”.
Mas não espere uma cinebiografia. Segundo o diretor Pedro Serrano, trata-se de “uma viagem pela obra do Adoniran, que busca uma São Paulo dos anos 1950, que vivia na lembrança dele, que ele romantizava, que era um lugar quase onírico de felicidade nas letras dele”.
A trama mostra o Adoniran (interpretado pelo Paulo Miklos), já do alto de seus 72 anos, contando ao garçom de um bar uma história fictícia baseada na letra da música “Saudosa Maloca”. É como se ele tivesse vivido aquela história junto com os amigos Matogrosso e Joca, ambos apaixonados por Iracema. Com ele e os amigos morando numa maloca que vai ser demolida, a trama retrata os perrengues de viver em condições precárias, sem dinheiro para comer, numa moradia que em breve será destruída para dar lugar à uma São Paulo "melhor". Outras músicas também são retratadas, como por exemplo o trio indo na casa do Arnesto participar de um churrasco e descobrirem, ao chegar lá, que o amigo não está em casa. Com isso, o filme celebra a cidade e o ícone do samba paulista.
Como locação dessa São Paulo antiga, utilizaram, dentre outros espaços, o Centro Cultural Vila Itororó, uma espécie de “minibairro” com prédios históricos tombados pela prefeitura de São Paulo. 
O que disse a crítica: Danilo Areosa do site Cineset avaliou com 3 estrelas, ou seja, bom. Disse: “Ao deixar de lado as amarras de fidelidade da cinebiografia pessoal, ‘Saudosa Maloca’ abraça os momentos mais conhecidos e importantes de Barbosa, suas relações com os personagens que vivem no bairro do Bixiga e o quanto isso contribuiu para suas músicas. Percebe-se que Serrano acredita que é por meio dessas histórias que o quebra-cabeças de quem é Adoniram Barbosa pode ser montado pelo próprio público na sua mente, sem precisa relatar as origens, a carreira no rádio e as influências musicais”. Entretanto, a obra “nem sempre consegue se apresentar muito atraente no campo narrativo devido suas caricaturas nos momentos mais dramáticos. A própria crítica social é simplificada em demasia pelo contexto fantástico da obra e nem sempre a figura real de Adoniram se ajusta a do mito, a do mestre do samba”.
Matheus Simonsen da Estação Nerd avaliou com 3,5 estrelas, ou seja, muito bom. Escreveu: “O bom humor do filme agrada pelo carisma, apesar de alguns momentos puxarem um pouco o tapete do potencial do longa, lembrando bastante aquele clima de novela das 18h. De todo modo, ‘Saudosa Maloca’ funciona como um agrado para essa breve passagem imaginativa entre as ruas de São Paulo e o talento de João Rubinato, ou melhor, Adoniran Barbosa. É uma bela homenagem, tanto na forma que o diretor consegue nos entregar seu carinho pela vida do artista, mas também fugir das convencionais cinebiografias genéricas e pouco inspiradas”.
O que eu achei: O filme começa com uma edição um pouco truncada e com um jeito italiano de falar meio caricato, mas depois ele engrena. As belas histórias que o Adoniran vai contar no bar para o garçom e as músicas que ele vai tocar naquela mesa suplantam qualquer problema que o filme venha a ter e, quando você menos espera, você foi fisgado e está emocionado com tudo o que está rolando. O cantor e ator Paulo Miklos, ex-vocalista da banda Titãs, é quem interpreta o Adoniran. Fiquei pensando o quão talentoso é esse rapaz, não é a primeira vez que o vejo num filme – assisti anteriormente “O Invasor” (2001) – e ele super dá conta do recado. É um ator e tanto. Só não espere ver uma cinebiografia. Se sua intenção for essa, melhor ver o documentário “Adoniran - Meu Nome É João Rubinato”, que o mesmo diretor lançou em 2018. Aqui a ideia é se divertir com a bela homenagem. Pode reunir a família e apertar o play sem medo, pois o filme é satisfação garantida, especialmente se você nasceu em São Paulo ou se tem antepassados italianos. Atenção à presença do músico Sergio Rosa, do grupo Demônios da Garoa, na cena do cemitério.