28.10.24

“O Castelo Vogelöd” - F. W. Murnau (Alemanha, 1921)

Sinopse:
Um grupo de aristocratas se reúne na mansão da família Vogelöd para um fim de semana de caça, mas as chuvas acabam fazendo com que o grupo desista de sair. Enquanto estão todos lá ociosos, uma pessoa não convidada chamada Conde Oechst (Lothar Mehnert) chega. Sua visita inesperada causa um certo incômodo pois há rumores de que ele tenha assassinado seu próprio irmão (Paul Hartmann). O desconforto social aumenta ainda mais quando a Baronesa Safferstäff (Olga Tschechowa), viúva do falecido, chega à casa com seu novo marido (Paul Bildt).
Comentário: Friedrich W. Murnau (1888 -1931) foi um dos mais importantes realizadores do cinema mudo, do cinema expressionista alemão e do estilo Kammerspiel. "Nosferatu" (1922), uma adaptação pessoal da novela "Dracula", de Bram Stoker, é o filme mais conhecido da sua obra (em boa parte perdida), juntamente com "A Última Gargalhada" (1924) e "Fausto" (1926). Em 1926, emigrou para Hollywood, onde, antes de morrer prematuramente aos 43 anos, realizaria o aclamado "Aurora" (1927). Vários de seus filmes estão perdidos. O seu último trabalho, "Tabu" (correalização com Robert Flaherty), foi filmado nos mares do sul, longe dos grandes estúdios e estreado postumamente. Atualmente é um filme cultuado, e marca uma quebra com a estética dos seus filmes anteriores. Assisti dele as obras-primas "Nosferatu" (1922) e "Aurora" (1927), os excelentes "A Última Gargalhada" (1924), "Tartufo" (1925), "Fausto" (1926) e "O Pão Nosso de Cada Dia" (1930) e os curiosos “Caminhada Noite Adentro” (1920) e "Tabu" (1931).
Desta vez vou conferir “O Castelo Vogelöd” (1921), baseado em romance de Rudolf Stratz, que conta a história de um grupo de aristocratas que se hospedam na mansão da família Vogelöd para um fim de semana de caça. Logo no primeiro dia, por conta da chuva, eles acabam impedidos de sair. Num dado momento, o mordomo anuncia a chegada do conde Oetsch, um homem que não havia sido convidado para o evento e de quem se desconfia que tenha matado seu irmão. Para completar o mal estar, na sequência chega à casa a viúva do assassinado, que casou-se novamente, desta vez com o barão Safferstätt.
Robert Keser do site Sense of Cinema nos conta que “Se o título tradicional em inglês (‘The Haunted Castle’, que em português seria ‘O Castelo Assombrado’) sugere o sobrenatural, o filme em si evita goblins ou golens em favor do desenrolar hipnótico de um horror moral. Embora a identidade do assassino possa ser prevista, o que é imprevisível é a intensidade onírica que Murnau constrói a partir da atuação contida e da encenação refinada, onde repetidamente os personagens saem das profundezas em direção ao primeiro plano, como que emergindo do subconsciente.
Embora este seja considerado o nono filme de Murnau, a câmera em primeira pessoa e os movimentos de varredura inovados em ‘A Última Gargalhada’ (1924) ainda estavam no futuro. Sem nenhuma das luzes piscantes e tomadas de rastreamento extravagantes dos filmes posteriores, ‘O Castelo Vogelöd’ oferece uma clareza diferente, suas imagens sutilmente perturbadoras ressoam especialmente seu sucessor imediato, ‘Nosferatu’ (1922), o filme de vampiro definitivo do cinema. Onde ‘Nosferatu’ externaliza a mortalidade em uma figura de horror, ‘O Castelo Vogelöd’ encontra o mal internalizado, condensado em quadros perturbadores e pontuado por reiteradas tomadas da mansão”.
O filme foi rodado em 16 dias. No elenco, além de Lothar Mehnert e Paul Hartmann, temos a russa Olga Tschechowa, que foi casada com o sobrinho do dramaturgo Anton Chekhov.
O que disse a crítica: Jeremias Kipp do site Slant Magazine avaliou com 3 estrelas, ou seja, bom. Escreveu: “Não se deixe enganar pelo título deste mistério tediosamente lento de Weimar, Alemanha [‘O Castelo Assombrado’] - quase não há fantasmagoria expressionista aqui. (...) Não espere nenhuma emoção sexual ou horror de peste de ‘Nosferatu’, ou a adoração amorosa enlouquecida de ‘Aurora’, ou o questionamento moral de ‘Fausto’, este poema tonal inferior de F.W. Murnau apenas flutua interminavelmente no piloto automático gótico”. E finaliza dizendo: “’O Castelo Vogelöd’ faz o espectador esperar, em um estado de antecipação, por algo que ressoe na tela - e parece positivamente infinito”.
Caio Bogoni do Cine Grandiose, que viu o filme num festival em 2017, avaliou com o equivalente a 3,75 estrelas, ou seja, muito bom. Disse: “’O Castelo Vogelöd’ se sai bem no que importa: apresentar um mistério e resolvê-lo. Dos trabalhos de F. W. Murnau, este era um dos que menos me atraía porque não parecia original ou chamativo o bastante. Nem as pessoas que conhecem seu trabalho falavam muito dele, o que tornou os aplausos no fim da sessão ainda mais surpreendentes. Para um longa tão pouco comentado, ele foi bem recebido em sua exibição durante o festival. Enquanto isso, me incluo entre estes entusiastas. Das três obras do cineasta alemão que vi, esta foi a que mais me agradou. É a menos ambiciosa e a mais simples, mas não deve ser menosprezada por isso. Ela encara um desafio que consegue completar”.
O que eu achei: Eu, que sou fã de carteirinha do Murnau, gostei demais de assistir a mais este filme do diretor. Dei a sorte de pegar uma versão restaurada a partir de material oriundo da Cinemateca de Berlim e da Cinemateca Brasileira, com intertítulos que faltavam reconstituídos com a ajuda do roteiro. O filme é mudo, datado de 1921, baseado em um conto de autoria de Rudolf Stratz publicado originalmente na revista semanal Berliner Illustrirte Zeitung. A trama tem suspense, você fica até o final sem saber quem é o monstro assassino dessa história, não é lento, nem cansativo, nem previsível como parte da crítica achou. Some-se a isso a bela fotografia, uma esplêndida locação, ótimas tomadas, enfim, outro filme do mestre que valeu a pena ser visto. Super recomendo.