
Comentário: Jafar Panahi (1960) é um cineasta iraniano de quem já assisti um documentário chamado "Isto Não É Um Filme" (2011) e seis filmes de ficção, todos excelentes: "O Balão Branco" (1995), "O Espelho" (1997), "Taxi Teerã" (2015), "3 Faces" (2018) e “Sem Ursos” (2022). Desde 2010 ele está proibido pela justiça de filmar ou sair do Irã sob a acusação de estar mostrando o regime de repressão que o povo iraniano vive, algo que o governo chama de “fazer propaganda contra o governo iraniano”. Mesmo assim Panahi está dando um jeito de filmar.
Desta vez vou conferir “Escondida” (2020) um curta-metragem que mostra mais uma dessas peculiaridades do Irã que parece estar não no século XXI, mas sim parado no tempo.
Arthur Gadelha do site Ensaio Crítico nos conta que “O zoom na chegada da personagem ao carro estacionado de Panahi nos primeiros segundos desse curta-metragem emula até com certo humor o contexto do ‘cinema escondido’ que o cineasta enfrenta há anos por ser um alvo de repressão do governo iraniano.
Sob o título referencial ‘Escondida’, uma espécie de meta-filme (apêndice de ‘3 Faces’) se intensifica quando descobrimos que aquela jornada busca uma mulher cuja voz, literalmente, é silenciada pelos pais. É dessa forma que Panahi, censurado pelo governo, traduz um olhar sóbrio sobre uma censura social. Certamente não há como comparar a perseguição do cineasta com o completo apagamento dessa mulher escondida, e talvez por isso esta seja uma história tão surpreendentemente curta.
Filmado por iPhones, como em ‘Taxi Teerã’, a conversa prévia entre Panahi, sua filha e a convidada que guia o caminho evoca a realidade sobre a moral machista vigente à coerção da existência feminina, a exemplo do pecado materializado na exibição de um sorriso com dentes.
Com caráter de recursos mínimos (tanto financeiro quanto de linguagem), a maior parte do filme se estabelece como um contexto recorrente para apresentar a imagem que nem iremos chegar a ver. Ao encontrarem a casa e se depararem, finalmente, com a mulher proibida de cantar pelos pais que temem que os jovens do vilarejo a escutem, somos surpreendidos com o lógico atrito que há entre a voz e a câmera. Pois é nessa última cena que Jafar Panahi encontra sua imagem de discurso mais eloquente por, justamente, encontrar significado na contradição da censura, na forma como documentar a ausência. É realmente impressionante o que faz ecoar a partir disso, que é quando o filme ousa chegar ao fim”.
Esse curta – somado a outros três – foram reunidos ainda em 2020 num longa chamado “Celles Qui Chantent” (em tradução literal “Aquelas que Cantam”). Os quatro longas, dirigidos por quatro diretores diferentes – Jafar Pananhi, Sergei Loznitsa, Karim Moussaoui e Julie Deliquet – são sobre “canções de mulheres que evocam à sua maneira o mundo em que cada uma delas vive”.
O que disse a crítica: Reema Gowalla do site OTTPlay avaliou o curta com 3,5 estrelas, ou seja, muito bom. Disse: “’Escondida’ é uma obra de arte cinematográfica de cortar o coração. Simples, mas feroz e misterioso, o curta tem o potencial e a razão para ser transformado em um longa-metragem. Ele representa delicadamente a vida ‘proibida’ de uma mulher com uma voz de ouro, mas deixa uma mensagem forte de que ainda podemos ajudar a trazer uma mudança positiva por meio das artes”.
Thiago Henrique Gonçalves Alves da Revista Malala (USP) também gostou do filme e escreveu “O fato de Panahi escolher uma jovem que (...) não deve fazer aparição e nem cantar em público, não é uma decisão aleatória. Nos últimos anos, o Irã tem sido centro de atenção de vários pensamentos políticos, e da luta pelos direitos humanos. Em 2022, uma jovem mulher iraniana foi morta após entrar em coma pela ‘polícia da moralidade’. [O filme] ‘Três Faces’ de 2018 e [este] ‘Escondida’ de 2020 são filmes importantes. Seja pela sua força e resistência, por serem feitos mesmo na ilegalidade, ou pelas questões sociais tratadas: o conservadorismo, a distância entre a arte e o povo, e a repressão da mulher no Irã. (...) Uma lembrança de que ainda há muito que se conquistar no país em relação aos direitos humanos e ao combate à censura”.
O que eu achei: Com o conceito sempre vindo em primeiro plano, o cineasta mostra não precisar de grandes recursos para veicular uma mensagem. Nem de recurso e nem de muito tempo - o curta tem 18 minutos de duração - para transmitir profundamente uma ideia. As imagens foram capturadas por dois smartphones - ótimos aliás para driblar a censura pois assim como no seu documentário “Isto Não é um Filme” (2011), isto aqui também poderia “não ser um filme”, mas sim uma captura de vídeo que todos fazemos habitualmente. Temos na cena duas mulheres reais numa aldeia curda vivendo suas vidas reais. E temos pouca edição, mas muito respeito na captura dessas imagens. O resultado é uma amostra eficaz da cultura iraniana. Excelente, como tudo o que o diretor faz.
Desta vez vou conferir “Escondida” (2020) um curta-metragem que mostra mais uma dessas peculiaridades do Irã que parece estar não no século XXI, mas sim parado no tempo.
Arthur Gadelha do site Ensaio Crítico nos conta que “O zoom na chegada da personagem ao carro estacionado de Panahi nos primeiros segundos desse curta-metragem emula até com certo humor o contexto do ‘cinema escondido’ que o cineasta enfrenta há anos por ser um alvo de repressão do governo iraniano.
Sob o título referencial ‘Escondida’, uma espécie de meta-filme (apêndice de ‘3 Faces’) se intensifica quando descobrimos que aquela jornada busca uma mulher cuja voz, literalmente, é silenciada pelos pais. É dessa forma que Panahi, censurado pelo governo, traduz um olhar sóbrio sobre uma censura social. Certamente não há como comparar a perseguição do cineasta com o completo apagamento dessa mulher escondida, e talvez por isso esta seja uma história tão surpreendentemente curta.
Filmado por iPhones, como em ‘Taxi Teerã’, a conversa prévia entre Panahi, sua filha e a convidada que guia o caminho evoca a realidade sobre a moral machista vigente à coerção da existência feminina, a exemplo do pecado materializado na exibição de um sorriso com dentes.
Com caráter de recursos mínimos (tanto financeiro quanto de linguagem), a maior parte do filme se estabelece como um contexto recorrente para apresentar a imagem que nem iremos chegar a ver. Ao encontrarem a casa e se depararem, finalmente, com a mulher proibida de cantar pelos pais que temem que os jovens do vilarejo a escutem, somos surpreendidos com o lógico atrito que há entre a voz e a câmera. Pois é nessa última cena que Jafar Panahi encontra sua imagem de discurso mais eloquente por, justamente, encontrar significado na contradição da censura, na forma como documentar a ausência. É realmente impressionante o que faz ecoar a partir disso, que é quando o filme ousa chegar ao fim”.
Esse curta – somado a outros três – foram reunidos ainda em 2020 num longa chamado “Celles Qui Chantent” (em tradução literal “Aquelas que Cantam”). Os quatro longas, dirigidos por quatro diretores diferentes – Jafar Pananhi, Sergei Loznitsa, Karim Moussaoui e Julie Deliquet – são sobre “canções de mulheres que evocam à sua maneira o mundo em que cada uma delas vive”.
O que disse a crítica: Reema Gowalla do site OTTPlay avaliou o curta com 3,5 estrelas, ou seja, muito bom. Disse: “’Escondida’ é uma obra de arte cinematográfica de cortar o coração. Simples, mas feroz e misterioso, o curta tem o potencial e a razão para ser transformado em um longa-metragem. Ele representa delicadamente a vida ‘proibida’ de uma mulher com uma voz de ouro, mas deixa uma mensagem forte de que ainda podemos ajudar a trazer uma mudança positiva por meio das artes”.
Thiago Henrique Gonçalves Alves da Revista Malala (USP) também gostou do filme e escreveu “O fato de Panahi escolher uma jovem que (...) não deve fazer aparição e nem cantar em público, não é uma decisão aleatória. Nos últimos anos, o Irã tem sido centro de atenção de vários pensamentos políticos, e da luta pelos direitos humanos. Em 2022, uma jovem mulher iraniana foi morta após entrar em coma pela ‘polícia da moralidade’. [O filme] ‘Três Faces’ de 2018 e [este] ‘Escondida’ de 2020 são filmes importantes. Seja pela sua força e resistência, por serem feitos mesmo na ilegalidade, ou pelas questões sociais tratadas: o conservadorismo, a distância entre a arte e o povo, e a repressão da mulher no Irã. (...) Uma lembrança de que ainda há muito que se conquistar no país em relação aos direitos humanos e ao combate à censura”.
O que eu achei: Com o conceito sempre vindo em primeiro plano, o cineasta mostra não precisar de grandes recursos para veicular uma mensagem. Nem de recurso e nem de muito tempo - o curta tem 18 minutos de duração - para transmitir profundamente uma ideia. As imagens foram capturadas por dois smartphones - ótimos aliás para driblar a censura pois assim como no seu documentário “Isto Não é um Filme” (2011), isto aqui também poderia “não ser um filme”, mas sim uma captura de vídeo que todos fazemos habitualmente. Temos na cena duas mulheres reais numa aldeia curda vivendo suas vidas reais. E temos pouca edição, mas muito respeito na captura dessas imagens. O resultado é uma amostra eficaz da cultura iraniana. Excelente, como tudo o que o diretor faz.