29.9.24

“Golpe de Sorte em Paris” – Woody Allen (França/EUA, 2023)

Sinopse:
Fanny (Lou de Laâge) e Jean (Melvil Poupaud) têm tudo o que um casal ideal queira ter: são realizados na vida profissional, vivem em um apartamento dos sonhos em Paris e parecem estar completamente apaixonados e felizes. Um dia ela reencontra Alain (Niels Schneider), um antigo amigo do colégio, e passa a entender que está vivendo uma vida não tão interessante assim, abrindo margem aos conflitos.
Comentário: Trata-se de um filme do diretor norte-americano Woody Allen de quem já assisti mais de 27 filmes, dentre eles os ótimos “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa” (1977), "Zelig" (1983), "Simplesmente Alice" (1990), "Ponto Final - Match Point" (2005), "Scoop - O Grande Furo" (2006), "Meia-Noite em Paris" (2011), "Para Roma com Amor" (2012) e "Café Society" (2016). “Golpe de Sorte em Paris” (2023) é o filme de número 50 do diretor.
Maria João Caetano do site CNN Portugal nos conta que “No último Festival Veneza, o novo filme de Woody Allen, ‘Golpe de Sorte’, foi aplaudido de pé pelo público durante cinco minutos. Ao mesmo tempo, na rua, em frente à sala de cinema, um grupo de manifestantes criticava o festival por lhe dar uma plataforma e protestava contra ‘a cultura de violação’. Faixas com as frases ‘Ilha de violadores’ e ‘Não há Leão de Ouro para predadores’ foram colocadas pela cidade para protestar contra a presença de Allen e também de Roman Polanski, cujo filme ‘O Palácio’ concorria ao prêmio principal deste ano.
Longe vão os tempos em que o gênio de Woody Allen era elogiado unanimemente por críticos e pelo público, que aguardava com expectativa a estreia de mais um [de seus] filmes (...). [Antigamente] Allen [era] o argumentista e realizador de uma cidade - Nova Iorque - e o porta-voz de uma geração de intelectuais que maldizia os blockbusters e enfrentava os seus demônios no divã do psicanalista. O herói dos seus filmes, quase sempre interpretado por ele próprio, não tinha músculos nem valentia, pelo contrário, era um sujeito neurótico, cheio de tiques, inseguranças, frases confusas e intermináveis. Debate-se com dúvidas e contradições, sobrevive à custa da autoironia, um humor autodepreciativo que põe os espectadores a rir das situações mais constrangedoras. (...) Nas últimas duas décadas, o seu cinema começou a acusar algum cansaço”.
A matéria relembra que “Dylan Farrow – filha adotiva de Woody Allen com a ex-parceira Mia Farrow, em 1992, quando ela tinha apenas sete anos, acusou Allen de a ter agredido sexualmente. As alegações foram investigadas duas vezes, mas nenhuma acusação foi apresentada e Woody Allen manteve sempre a sua inocência. E tinha conseguido, em grande medida, que esta suspeita não afetasse a sua reputação como cineasta. No entanto, Dylan e seu irmão Ronan Farrow fizeram declarações posteriores que levaram muitos a condenar Allen. As redes sociais fizeram o resto, colocando o tema de novo na atualidade. Em 2021, um documentário na Netflix contou toda a história do ponto de vista de Mia e Dylan”, que para Allen não passa de uma difamação. Mesmo assim ele se afastou dos holofotes, voltando a aparecer agora em Veneza para lançar “Golpe de Sorte”.
Atualmente Allen é casado com Soon-Yi Previn - outra filha adotiva de Mia Farrow, 35 anos mais nova do que ele. Apesar das fofocas, o casal tem duas filhas e o casamento ocorrido em 1997 permanece estável.
Com relação ao novo filme, “Golpe de Sorte” é um thriller com algumas notas de comédia, falado em francês e protagonizado pelos atores Lou de Laâge, Valérie Lemercier, Melvil Poupaud e Niels Schneider. O filme segue um casal, Fanny e Jean, cujas vidas aparentemente perfeitas em Paris são perturbadas quando Fanny se apaixona por um antigo colega de escola, Alain. Trata-se de uma história sobre ciúmes, poder, romance e infidelidade conjugal onde o acaso e as coincidências têm um papel determinante.
Com pouco espaço para trabalhar nos EUA, Woody Allen, que sempre foi muito acarinhado pelo público europeu, já havia filmado na Espanha, na França, no Reino Unido e na Itália. Portanto não é novidade ele apresentar agora uma nova produção francesa. O que não sabemos é se este será ou não seu último filme.
O que disse a crítica: Eurico de Barros do site Time Out avaliou com 3 estrelas, ou seja, bom. Escreveu: “O 50° (...) filme de Woody Allen foi rodado em Paris (...) mas pelo meio social em que se passa (o da burguesia próspera), pela maneira como o realizador olha para a cidade, pela caracterização das personagens, pela direção dos atores e pela sua vibração geral, ‘Golpe de Sorte’ poderia muito bem ter sido ambientado em Nova Iorque, na bem-amada Manhattan do realizador”. Segundo ele, o filme lembra produções anteriores do diretor como “Crimes e Pecados” e “Match Point”, havendo a presteza, a clareza e a elegância habituais do cineasta.
João Garção Borges do site Magazine HD avaliou com 3,75 estrelas, ou seja, ficou ali entre o bom e o ótimo. Na sua lista de pontos altos do filme estão: a interpretação dos atores, protagonistas e secundários e a boa seleção musical e correspondente trilha sonora, dominada em grande medida pelas sonoridades do compositor e pianista de jazz Herbie Hancock, numa espécie de homenagem a referentes musicais da produção cinematográfica francesa dos anos 50 e 60 e nas então contribuições de Miles Davis, Michel Legrand ou do Modern Jazz Quartet. Segundo Borges, “sorte a nossa por ele continuar a filmar!”.
O que eu achei: Sabemos que nos últimos 44 anos, a imagem do Woody Allen foi afetada após uma acusação de abuso sexual por parte da enteada da Mia Farrow (sua ex-esposa), então de lá pra cá tem ficado muito difícil pra ele conseguir financiamento, especialmente dentro dos EUA. Com isso, a Europa tem sido uma opção para rodar seus filmes e este, todo feito na França, tem esse diferencial de ser rodado em francês. Eu gostei, achei o filme bem feito, a fotografia (luz, cores, enquadramentos) é muito agradável, a trama bem arranjada como já é de se esperar de todos os filmes do diretor, elenco bem equilibrado onde ninguém rouba a cena de ninguém e trilha sonora ótima com músicas do compositor e pianista de jazz Herbie Hancock. Eu só não posso dizer que o filme é excelente, pois é inevitável compará-lo à outras produções do diretor, especialmente os filmes da fase em que ele dirigia e atuava. Creio que aquela fase é insuperável. Mas este vem na toada dos últimos filmes dele como “Ponto Final - Match Point" (2005), “Homem Irracional” (2015), “Roda Gigante” (2017), “Um Dia de Chuva em Nova York” (2018) e o “O Festival do Amor” (2020), dentre outros. Temos na trama um casal,  uma traição e seus desdobramentos. Como agora, além desse problema do cancelamento, ele está com 88 anos, talvez esta seja sua última produção. Vale ver.