12.8.24

“Exorcismo Negro” – José Mojica Marins (Brasil, 1974)

Sinopse:
Um diretor de cinema (José Mojica Marins) vai passar um fim de semana no campo, na casa da família de um amigo (Walter Stuart), para descansar e tentar escrever o roteiro de um novo filme, chamado "O Tirador de Demônios". Mas a paz do local logo será quebrada por diversos fenômenos paranormais e por uma força maléfica que começa a possuir os membros da família.
Comentário: José Mojica Marins (1936-2020) foi um cineasta, ator, apresentador e roteirista de cinema e televisão brasileiro. É considerado o pai do terror nacional, tendo sua obra grande importância para o gênero e influenciando várias gerações. Seu icônico personagem Zé do Caixão, interpretado pelo próprio Mojica, está presente em diversos de seus filmes e é responsável por tê-lo tornado mundialmente conhecido. Assisti dele cerca de 11 filmes, todos trash, sendo que os que eu mais gostei foram: "À Meia-Noite Levarei Sua Alma" (1964), "Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver" (1967), "O Estranho Mundo de Zé do Caixão" (1968), "Ritual dos Sádicos / O Despertar da Besta" (1969), "Finis Hominis (O Fim do Homem)" (1971), "Delírios de Um Anormal" (1978) e "Encarnação do Demônio" (2007).
Ruy Gardnier do Portal Brasileiro de Cinema nos conta que “De todas as incursões de José Mojica Marins no gênero fantástico, ‘Exorcismo Negro’ talvez seja seu filme de construção mais serena, cadenciada, atmosférica até. Ele vai criando seu ritmo aos poucos, preparando lentamente para um clímax que afinal revelará a origem de todos os mistérios surgidos ao longo do filme. Assim, num certo sentido, é talvez, de toda sua filmografia de terror, o filme que mais se alinha a uma tradição ficcional reconhecida e característica, distante do imaginário mondo cane ao qual suas produções costumam ser associadas, não sem certa razão.
Mesmo que o filme tenha sido concebido para aproveitar a onda de ‘O Exorcista’ (1973), lançado no mesmo ano, isso no fundo não explica a mudança de tom e a abordagem diferente do diretor. Essa mudança talvez deva-se mais a um desejo de testar seu talento em outras praias. (...) A surpresa não vem das dúvidas no talento, mas do fato de os outros filmes de terror de Mojica Marins funcionarem num ambiente de choque puro, de imagens fortes e inventivas, sem necessidade de construção do suspense. ‘Exorcismo Negro’, todavia, é só suspense, um calmo desenrolar de cenas misteriosas, filmadas em tom menor, até que o clímax venha fechar a história com chave de ouro, no momento da resolução da trama.
Nos melhores filmes de terror de Mojica, o desenvolvimento narrativo geralmente funciona como uma espécie de ilustração da tese filosófica que o filme sustenta. Aqui, ocorre o contrário: de fato, o filme se desenrola como um embate entre criador, o cineasta José Mojica Marins, e Zé do Caixão, a criação cinematográfica que, como indicam certos fenômenos paranormais, tem vida própria para além dos filmes. Mas essa é apenas uma linha narrativa suplementar, que funciona em segundo plano em relação à história da perfeita família do interior assombrada por um passado que esconde um misterioso pacto com o demônio. Ainda que essas duas linhas venham a se encontrar no final, a questão filosófica não será respondida. Essa prevalência da narrativa sobre a ‘mensagem’ confere à história uma solidez rara entre as obras do diretor (...)”.
A história foi pensada por Aníbal Massaini Neto, filho de Oswald Massaini, lenda da Boca do Lixo. O produtor convidou Mojica para assumir a direção e encontrar um jeito de desenvolver a história, desta vez com mais verba do que de costume.
O que disse a crítica: Leonardo Campos do site Plano Crítico avaliou com 3 estrelas, ou seja, bom. Disse: “Apesar da sofisticação estética, Mojica pede licença ao público nos momentos finais, especificamente na missa negra, exagerando como de costume nos diálogos, na montagem e na concepção visual do trecho. A missa negra realizada para cobrar a dívida da bruxa é regida com todos os clichês do subgênero à exaustão e ainda abre espaço para perpetuar estereótipos desconcertantes, pois associa o satanismo ao candomblé, misturando matrizes e culturas. Tal problema, por sua vez, apesar de preocupante, não chega a estragar o desenvolvimento do enredo”.
Ted Rafael Araujo Nogueira do site Cineplayers avaliou com 4,5 estrelas, ou seja, excelente. Escreveu: “...o mosaico da criação desta fita é perfeito. Por causa deste encontro de si com si. A catarse do universo iconoclasta do Zé-personagem que o Mojica-diretor, dentro da fita, vê sob ótica de culpa e responsabilidade própria diante da sua criação. Sua saída de cena melancólica contrasta com a gargalhada dum Zé sacana. Mojica demonstra, como sempre, que era um cara foda”.
O que eu achei: Uma surpresa assistir a este filme que, a meu ver, difere bastante dos demais filmes que vi dele. Nos outros o foco está sempre na overdose de cenas chocantes e aterrorizantes. Neste a ênfase se desloca para a narrativa tornando a trama mais envolvente. No elenco, ao invés dele trabalhar com os amigos que se dispunham a participar, desta vez temos pessoas conhecidas como Alcione Mazzeo, Geórgia Gomide, Jofre Soares, Marcelo Picchi, Walter Stuart, Wanda Kosmo e Adriano Stuart (que também foi parceiro de Mojica no roteiro). Com uma verba maior e esse time de atores o resultado é bem mais sofisticado do que se espera habitualmente. Gostei bastante.