15.7.24

“Decadência” – Alfred Hitchcock (Reino Unido, 1927)

Sinopse:
Num colégio interno da alta sociedade, dois amigos universitários, Roddy Berwick (Ivor Novello) e Tim Wakely (Robin Irvine), cortejam a mesma moça (Isabel Jeans), fazendo votos para que nada destrua a sua amizade. Mas quando esta vem à escola para acusar Roddy de a ter assediado, este é expulso do colégio perante a impassividade do amigo que é o verdadeiro culpado. Roddy é inocente, mas decide proteger o amigo Tim, que vem de uma família mais pobre que a sua. É aí que começa sua derrocada.
Comentário: Trata-se da 7ª produção do mestre Alfred Hitchcock, de quem já assisti 35 filmes.
Luiz Santiago do site Plano Crítico nos conta que “’Downhill’ [Decadência] foi um dos últimos dois filmes que Alfred Hitchcock dirigiu para a Gainsborough Pictures. Ele marca a volta de Ivor Novello para um trabalho em parceria com o diretor, depois do sucesso obtido com ‘O Inquilino’ (1926). O roteiro do longa é baseado em uma peça do próprio Novello e de Constance Collier, contando a história de um jovem estudante que é falsamente acusado por uma garota (falaremos da acusação um pouco mais adiante) e expulso do Colégio onde estuda. A partir desse momento, dá-se início ao declínio financeiro e psicológico do personagem, uma jornada bastante pessimista na qual se centra todo o desenvolvimento da obra. (...)
Mais uma vez comprovamos a preferência de Hitchcock por experimentos estéticos, saindo-se muito melhor do que em seu primeiro filme e seguindo numa linha bem parecida com suas manipulações de imagem de ‘O Inquilino’. Todo o peso dessa manipulação está na perturbação psíquica de Roddy, onde podemos ver de tudo, desde alteração do foco, mixagem de planos, fusão de imagens e truques de montagem. Soma-se a isso uma série de alegorias utilizadas pelo diretor para firmar a ideia de decadência do rapaz, como se víssemos os momentos exatos em que a roda da fortuna o derrubava de seu posto. Esses momentos são representados por ele descendo escadas e, toda vez que isso acontece, algo ainda mais triste o ataca em seguida. (...)
‘Downhill’ é uma história pessimista sobre um jovem que sofre sérias consequências por algo que não fez. O tema apareceria outras vezes na filmografia de Hitchcock, sempre pontuado pela decadência do personagem que recebe a acusação. Há diversos elementos nesse filme que fariam parte da cartilha do diretor nos anos seguintes, além de cenas que ele nos ‘mostraria novamente’, como o momento em que Julia vê Roddy entrando na sala: de seu ponto de vista, ele aparece na tela de ponta cabeça, exatamente o mesmo ângulo em que vemos Cary Grant do ponto de vista de Ingrid Bergman, em ‘Interlúdio’ (1946).
‘Downhill’ não foi muito bem recebido pela crítica e nem pelo público. Talvez quisessem algo na linha de ‘O Inquilino’ ou talvez este não fosse o tipo de filme que esperavam ver assinado por Hitchcock, algo que o diretor teve de se acostumar ao longo dos anos e, em dado momento de sua carreira, constatar a figura que faziam dele e de sua obra: ‘Sou um diretor estereotipado. Se eu fizesse Cinderella, o público estaria imediatamente procurando por um corpo na carruagem’.”.
O que disse a crítica: Santiago avaliou com 3 estrelas, ou seja, bom. Escreveu: “O início da película nos traz uma bela sequência de planos, apresentando Roddy (Ivor Novello) de maneira dramaticamente interessante. Essa valorização do personagem logo nos primeiros minutos é importante para criar o contraste com o tipo de pessoa e a situação na qual ele vai se ver em algum tempo. Todavia, a boa apresentação inicial se torna confusa à medida que vemos a chegada de novos personagens em cena. Como há um número bem pequeno de intertítulos, fica difícil para o espectador estabelecer relações imediatas entre cada um dos atores e seus papéis, gerando algumas confusões fisionômicas (...) e ainda complicações no que diz respeito aos motivos do roteiro. Embora não seja uma história complexa, o verdadeiro delito de Roddy nunca é totalmente entendido, principalmente se compararmos o que o diretor disse em entrevistas sobre o filme e o que vemos na tela”.
O site Cine Análise também avaliou com 3 estrelas. Disseram: “’O Inquilino’, de 1927, mostrou que a parceria entre o jovem Alfred Hitchcock e o ator Ivor Novello havia dado muito certo. O filme havia sido um grande êxito de crítica e público, o primeiro na carreira do cineasta. (...) Só que, dessa vez, o sucesso não veio. Talvez as pessoas estivessem esperando um novo thriller, e se depararam com um melodrama. Talvez elas não tenham apreciado o tom pessimista da obra. Tanto tempo depois do lançamento do filme, é impossível descobrir o que o público não aprovou em ‘Downhill’. Até porque o filme não é ruim. Pode ser pouco original e confuso às vezes, mas ruim não é”.
O que eu achei: Como é agradável ver um filme P&B tonalizado oras em sépia, oras em amarelo, oras em azul e mudo. Ainda mais quando você dá a sorte de encontrar o material em bom estado e com alguma boa trilha sonora atrelada. De fato, não parece uma película de Hitchcock. Estamos em 1927, esse é apenas o seu sétimo filme como diretor, então seu estilo ainda não devia estar totalmente definido e o que vemos é um melodrama ao invés do tão esperado suspense. Li que a crítica da época não gostou do filme, talvez por ter sido lançado após a obra “O Inquilino” - também conhecida como “O Pensionista” - do mesmo ano e com o mesmo ator Ivor Novello no papel principal, que é um filme e tanto mesmo. Esse não é tão espetacular, mas é uma boa trama, com bom desenvolvimento, bons atores, enfim, um trabalho digno que poderia ter sido mais bem aceito. Creio que a comparação acabou tirando o brilho deste outro que se por um lado é mais linear e menos elaborado, tem seus pontos altos nos experimentos estéticos e por tratar de temas como a prostituição masculina, por exemplo. Com certeza merece ser visto.