17.7.24

“All the Beauty and the Bloodshed” - Laura Poitras (EUA, 2022)

Sinopse:
O documentário aborda a vida e a carreira da fotógrafa Nan Goldin, além de mostrar sua batalha contra a notória família Sackler, dona de uma  farmacêutica responsável pelo incontável número de mortos na epidemia de opioides nos EUA.
Comentário: Laura Poitras (1964) é uma documentarista americana. Entre seus filmes estão “Flag Wars” (2003), “My Country, My Country” (2006), “The Oath” (2010), “Citizenfour” (2014) - vencedor do Oscar de Melhor Documentário - e “Risk” (2016).
O documentário “All the Beauty and the Bloodshed” (Toda a Beleza e o Derramamento de Sangue), gira em torno da vida e do trabalho da fotógrafa e ativista americana Nan Goldin (1953), famosa por seu trabalho artístico sobre o mundo LGBT, a crise do HIV e a epidemia de opioides. Dentre seus trabalhos mais famosos estão:
- “The Ballad of Sexual Dependency” (A Balada da Dependência Sexual), uma exposição que reúne cerca de 700 retratos que a artista sequenciou em vídeo acrescentando uma trilha sonora que vai de Maria Callas a The Velvet Underground. A narrativa é profundamente pessoal, formada a partir das próprias experiências da artista em Boston, Nova York, Berlim e outros lugares nos anos 1970/1980. O resultado é uma espécie de ópera do centro da cidade que reúne diferentes tipos, incluindo a própria artista, capturados em momentos íntimos de amor e perda. Eles experimentam êxtase e dor através do sexo e do uso de drogas, se divertem em clubes de dança, se relacionam com os filhos em casa, sofrem com a violência doméstica e os estragos da AIDS. Além do vídeo, a instalação apresenta fotografias impressas, posteres, folhetos e performances ao vivo.
- "Witness: Against Our Vanishing" (Testemunhas: Contra o Nosso Desaparecimento) que foi uma mostra com curadoria da Nan Goldin, organizando uma reflexão sobre a influência que a AIDS teve na estética, na cultura e na sexualidade, especialmente sobre uma comunidade de artistas do Lower East Side, um famoso bairro em Manhattan, Nova York. A mostra ocorreu entre NOV/1989 a JAN/1990, reunindo fotografias, desenhos, pinturas e esculturas de diversos artistas como David Armstrong, Tom Chesley, Dorit Cypis, Phillip-Lorca diCorcia, Jane Dickson, Clarence Elie-Rivera, Darrel Ellis, Allen Frame, Peter Hujar, Greer Lankton, Siobhan Liddell, Mark Morrisroe, Perico Pastor, Margo Pelletier, Vittorio Scarpati, Jo Shane, Kiki Smith, Janet Stein, Tabboo! Stephen Tashjian, Shellburne Thurber, Ken Tisa, Robert Vitale e David Wojnarowicz.
Flavia Guerra do site Splash UOL nos diz que o foco do filme é “a luta dela contra a poderosa família Sackler, que detém, entre outros, a farmacêutica Purdue Pharma, grande responsável pela epidemia de casos de dependência de opioides nos Estados Unidos que já tem mais de 500 mil mortos e ainda não chegou ao fim. (...) Com um roteiro engenhoso, que traça linhas narrativas que se cruzam entre a infância traumática de Goldin, seu trabalho inovador como artista, sua vida em meio aos nomes que revolucionaram os costumes e a arte nos anos 70 e 80, e principalmente, o ativismo de Goldin com o P.A.I.N. (Prescription Addiction Intervention Now), o documentário conta uma história emocionante e, ao mesmo tempo, repleta de informação e capaz de causar indignação. Fundada por Goldin, depois que ela se tornou dependente de oxycodona, após ter sido receitado contra dores que ela sofria após uma cirurgia, o P.A.I.N. (que faz um jogo de palavras com o significado em inglês: dor) pede intervenção contra a dependência química de medicamentos e promove atos em prestigiados museus dos Estados Unidos e Europa (...) para que a Sackler/Perdue seja responsabilizada pela forma irresponsável e gananciosa que propagou o medicamento OxyContin e como não alertou a população sobre seus riscos”. Segundo Guerra, o documentário mostra também as ações da fotógrafa no The Metropolitan Museum (Nova York) e no Louvre (Paris) e exibe conversas sobre seus trabalhos mais emblemáticos.
O filme recebeu o Leão de Ouro no Festival de Veneza e foi indicado ao Oscar de Melhor Documentário.
O que disse a crítica: Lucas Pistilli do site Cineset avaliou com 3 estrelas, ou seja, bom. Ele achou que a diretora não se encontrou em meio a tantos temas. Escreveu: “’All the Beauty and the Bloodshed’ (...) é um olhar destemido sobre traumas pessoais e a transformação da vida em arte. É também uma investigação sobre a epidemia dos opioides, uma retrospectiva biográfica, entre outras coisas. De fato, o longa consagrado com o Leão de Ouro em Veneza este ano diz tanta coisa que se perde em meio aos seus diversos pontos”.
Ritter Fan do site Plano Crítico avaliou com 5 estrelas, ou seja, obra-prima. Disse: “’All the Beauty and the Bloodshed’ não é e não quer ser uma obra de fácil digestão e Poitras consegue, mesmo dando-se ao luxo de enveredar por uma abordagem inicialmente hermética, contar uma rica história de vida que se confunde com alguns dos mais relevantes aspectos socioeconômicos e políticos das últimas várias décadas e que tem na arte sua manifestação máxima. Se Goldin fez de sua vida a inspiração de sua arte e de sua forma de encarar o mundo, Poitras faz de seu documentário mais um elemento que se confunde e informa a própria vida e causas que aborda”.
O que eu achei: Quem gosta de fotografia com certeza já ouviu falar dos trabalhos da americana Nan Goldin e esta é uma oportunidade de ouro para conhecer melhor a artista. O documentário mostra sua vida em família, seus pais e a relação com sua irmã mais velha que era homossexual e acabou, por conta disso, sendo internada pelos pais ignorantes para tratamento. Ela acabou se suicidando e isso afetou diretamente a vida de Nan. É nesse período entre a adolescência e a idade adulta que ela envereda pelo submundo das drogas e da prostituição, vivenciando tudo isso na própria pele e registrando em fotografias aquilo que seria sua exposição mais importante - “The Ballad of Sexual Dependency” (A Balada da Dependência Sexual) – que se tornou um retrato íntimo dessa fatia da sociedade nos anos 1970/1980 com a epidemia de AIDS. Em paralelo, o documentário mostra um tratamento de saúde feito pela Nan que a levou ao vício em OxyContin (oxycodona), um opioide aprovado pela FDA produzido pela farmacêutica Purdue Pharma de propriedade da família Sackler. O produto se mostrou altamente viciante e Nan, que lutava para se desfazer do vício, descobriu que inúmeras pessoas estavam morrendo por conta do uso desse remédio, enquanto a família enriquecia ainda mais. Ela travou uma luta contra o laboratório e obteve resultados. O documentário é longo mas com certeza vale ser visto, especialmente por quem se interessa por fotografia ou por política ou pelo cruzamento dos dois.