9.6.24

“Sede Assassina” - Damián Szifron (EUA/Canadá, 2023)

Sinopse:
Baltimore, véspera de Ano Novo, um atirador de elite (Ralph Ineson), aproveitando o barulho dos fogos de artifício, mata 29 pessoas sem deixar nenhum vestígio. A polícia investiga, mas apenas Eleanor (Shailene Woodley), uma agente antissocial e problemática, tem os requisitos para resolver o caso. A sua psique conturbada pode ser a única capaz de compreender melhor a mente do assassino.
Comentário: Damián Szifron (1975) é um roteirista e cineasta argentino. Ele dirigiu em torno de nove filmes, além de séries de TV. Assisti dele o excelente “Relatos Selvagens” (2014) indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.
O título original do filme “Misanthrope” (Misantropo) advém da palavra misantropia, também chamada de antropofobia. Ao contrário da filantropia, designa a aversão ou o ódio ao ser humano ou à humanidade em geral seja em nível social, cultural, religioso, econômico, etc. Em outras palavras, a misantropia envolve uma antipatia geral para com a humanidade e a sociedade. Misantropos são pessoas que aparentemente não padecem de nenhum transtorno, mas que tendem a ser muito desconfiadas, irônicas e sarcásticas, costumam se sentir superiores e preferem não estreitar laços com ninguém, evitando assim, o contato social. Em muitos casos, esse problema pode levar a quadros mais graves como o sofrimento, a depressão ou até o suicídio.
Cesar Soto do site G1 nos conta que é a segunda vez que Szifron demora nove anos para lançar um filme. Em 2005 ele lançou "Tempo de Valentes", somente em 2014 “Relatos Selvagens” e agora, novamente, deu-se um intervalo de nove anos para ele lançar “Sede Assassina” (2023). Soto diz que este novo filme é “a primeira tentativa do cineasta no comando de uma produção americana (...). Estrelado por Shailene Woodley e Ben Mendelsohn, o thriller retrata a busca por um assassino serial que ataca alvos aleatórios com um rifle de precisão. (...) 
Mas o que leva um dos jovens diretores mais populares de um país ficar quase mais uma década sem lançar qualquer tipo de trabalho novo, no cinema ou na TV? Parte da explicação, segundo o próprio Szifron, vem de um paralelo entre ele e o antagonista de seu novo filme – batizado originalmente de "Misantropo". Assim como o assassino, o cineasta tem uma certa aversão à vida em sociedade. ‘Claro, há diferentes graus de misantropia, mas todos eles tendem a gostar de natureza, liberdade, tempo, espaço, silêncio, chuva, animais e natureza’, diz ele em entrevista ao G1. ‘O que eles desgostam é da sociedade, basicamente. (...)’. Por isso, passou grande parte dos últimos anos viajando com a família e escrevendo - muitos projetos que ele mesmo sabe que nem têm como serem desenvolvidos”.
Com relação ao filme em si, Szifron declarou que “O personagem que cresceu muito (...) foi o de Ben Mendelsohn [que faz o papel do agente Lammark]. De certa forma, eu diria que ele é meu alter ego dentro da trama do filme. Já o FBI funciona como uma espécie de metáfora das corporações americanas e a forma como o poder é disputado e o porquê ele é disputado (...). Pegar esse assassino já é muito difícil, porque ele é diferente de todos os outros assassinos seriais que já existiram. A polícia não está preparada para pegá-lo. Ele é como se Jason Bourne ou John Rambo virassem do mal, e você não consegue parar um cara assim. Então, isso já é bem difícil. Mas eu estava ainda mais interessado em contar todos os desvios, todas as coisas com as quais essa equipe deve lidar ou desperdiçar energia por causa de egos ou de disputas de poder superficiais e vaidade. Para mim, isso é devastador para esse grupo de heróis. Porque eles gastam toda a sua energia para tentar fazer o que sabem fazer e pegar esse cara que eles já não sabem como pegar”.
O que disse a crítica: Marcelo Müller do site Papo de Cinema avaliou com 3,5 estrelas, algo como muito bom. Escreveu: ‘Sede Assassina’ se trata de um exemplar relativamente atípico desse filão tradicional no cinema norte-americano [que são os filmes sobre serial-killers]”. Segundo ele, “Esse tipo de filme de caça ao serial killer geralmente tem como seus heróis homens brancos, às vezes jovens impetuosos que aprendem algo durante a aventura, noutras sujeitos experientes que demonstram a capacidade de contribuir próximos à aposentadoria. Em ‘Sede Assassina’, o trio principal é formado por uma mulher, um homem negro e outro homossexual. Ainda que a tríade não seja explorada simbolicamente como conjunção de maiorias minorizadas em prol da salvação do dia, essa brigada de resgate é relevante dentro da perspectiva de combate efetivo às doenças dos Estados Unidos. E, felizmente, ninguém é romantizado, todos têm suas zonas sombrias e arestas, por mais que elas tampouco sejam aprofundadas”.
Caio Coletti do site Omelete avaliou com 5 estrelas, ou seja, obra-prima. Disse: “’Sede Assassina’ se aproxima sem nenhum pudor da feiura aleatória da epidemia de ataques armados nos EUA, mas sua maior audácia é localizar e centralizar as raízes culturais da podridão americana: o consumismo e o individualismo como dois lados da mesma moeda; a crueldade interpessoal como sintoma da mentalidade que preza o sucesso a qualquer custo; a desigualdade institucional e econômica como combustível da supervalorização da violência”.
O que eu achei: O filme não correspondeu às minhas expectativas. Ele está há anos-luz do excelente “Relatos Selvagens” (2014) que chegou a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. “Sede Assassina” veio após um hiato de nove anos sem o diretor argentino Damián Szifron apresentar nada, então eu esperava demais desse seu debut no comando de uma produção americana. O filme é apenas mais um exemplar desse já tão batido gênero policial com o FBI se desdobrando para descobrir a identidade e capturar um serial killer que atirou e matou 29 pessoas durante a explosão dos fogos de artifício de um réveillon em Baltimore. Não vi nada de inovador ou revolucionário dentro do gênero, a não ser o fato dele colocar um homossexual no comando das investigações juntamente com dois policiais: um negro e uma mulher perturbada. O roteiro até ameaça tratar de assuntos como o sofrimento animal, a mídia que gera pânico na população, a questão armamentista e os tiroteios em massa, mas não há profundidade em abordá-los, com alguns trechos chegando a ser cansativos. No máximo vale como uma reflexão sobre a América e sua violência. Mediano.