16.6.24

“A Lei de Quem Tem o Poder” - Bertrand Tavernier (França, 1981)

Sinopse:
1938, estamos numa colônia francesa na África. Lucien Cordier (Philippe Noiret) é a autoridade policial de uma vila habitada por negros e brancos, geralmente racistas. Ele é um perdedor e todos o humilham, incluindo sua esposa Huguette (Stéphane Audran). Lucien nunca prende ninguém e olha pro outro lado quando um crime acontece. Mas certo dia, ele se transforma num maquiavélico anjo exterminador.
Comentário: Bertrand Tavernier (1941-2021) foi um cineasta, roteirista e produtor francês que dirigiu mais de 28 filmes, a maioria deles exprimindo sua aversão às injustiças, seu engajamento contra a guerra, contra o racismo e os estragos do colonialismo ou contra a pena de morte. Temas como delinquência, violência, desemprego, misérias físicas e afetivas, drogas e AIDS são recorrentes. É a primeira vez que assisto um filme dele.
“A Lei de Quem Tem o Poder” (1981) foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. A história foi adaptada de um romance de 1964 chamado "Pop. 1280" (1280 Almas), do escritor Jim Thompson. O filme mudou o cenário do romance de uma cidade do sul dos Estados Unidos para uma pequena cidade na África Ocidental Francesa. As filmagens aconteceram em Louga e em Saint-Louis, no Senegal.
A trama se passa em 1938, na cidade de Bourkassa, África Ocidental. Lucien Cordier (Philippe Noiret) é a autoridade policial de uma vila habitada por negros e brancos, geralmente racistas. Ele é um perdedor e todos o humilham, incluindo sua esposa Huguette (Stéphane Audran). Lucien nunca prende ninguém e olha pro outro lado quando um crime acontece. Mas certo dia, ele se transforma num maquiavélico anjo exterminador.
Esta mistura de comédia e drama policial explora a mentalidade colonialista e seu complexo delirante de Deus e o senso distorcido de justiça por meio da filosofia de seu personagem principal. No elenco, além da dupla Philippe Noiret e Stéphane Audran, temos Isabelle Huppert.
Tavernier disse em entrevista que este filme: "É sobre vingança, é claro, mas também é sobre outra coisa. É sobre Deus e livre arbítrio, e tem muitas implicações religiosas e metafísicas".
Uma curiosidade levantada pelo crítico de cinema Michael Dare do site The Criterion Collection: na abertura, somos corretamente informados de que o filme é baseado no livro “Pop. 1280”, mas durante os títulos finais, somos informados incorretamente de que é baseado em “Pop. 1275”. Fica a pergunta: teria sido isso um erro de digitação ou uma referência não tão sutil ao fato de cinco pessoas brancas serem mortas no decorrer do filme?
O que disse a crítica: Roger Ebert avaliou com 2,5 estrelas, ou seja, mediano. Ele escreveu que Tavernier é um excelente cineasta que “quando opta por observar o cotidiano de personagens profundamente sentidos, sentimos uma empatia imediata. Mas ‘Coup de Torchon’ me deixou frio e indiferente. Tudo o que pude encontrar para admirar foi o artesanato. Isso foi depois de duas exibições. Vi o filme pela primeira vez no Festival de Cinema de Chicago (...) e não tinha certeza se realmente havia me envolvido com o filme. (...) Eu o vi novamente (...) e tive a mesma sensação estranha de que os eventos na tela, embora estivessem tão firmemente enraizados em um local real, eram insubstanciais. Apesar da poeira, apesar do lento rio lamacento, apesar dos vestidos sujos, da casa e da sombra das 5 horas e dos bocejos e brigas repentinas e piadas obscenas, este filme nunca respira. É um exercício. Você pode admirar um exercício, mas é difícil realmente se importar com ele”.
Michael Dare do site The Criterion Collection gostou. Escreveu: “De acordo com David Ansen na Newsweek , ‘Ambiguidade é o tema e o estilo de Tavernier: às vezes você pode coçar a cabeça, imaginando exatamente qual é o objetivo desta fábula sombria, mas você provavelmente será seduzido por seu humor macabro. Pode parecer impossível fazer um filme humorístico que adote seriamente o niilismo. Mas nas mãos de um mestre como Tavernier, até a ambiguidade pode ser divertida”.
O que eu achei: O filme é uma adaptação do livro "Pop. 1280" de 1964 do escritor Jim Thompson, referindo-se ao número de pessoas que residem numa determinada cidade dos EUA. Nessa adaptação para o cinema, Tavernier mudou o local para Bourkassa, na África Ocidental Francesa. O ano é 1938 e um dos brancos franceses que lá reside comenta, logo no início do filme, que na cidade há 1.275 almas, explicando que “como negros não têm alma, a população nativa não é contada”. Até nos créditos o mesmo “erro” ocorre, informando que o filme foi baseado no romance “Pop. 1275”. Essa curiosidade já havia sido apontada pelo crítico de cinema Michael Dare do site The Criterion Collection. Ele não sabe explicar se isso teria sido um erro de digitação ou uma referência ao fato de que cinco pessoas brancas morrem no decorrer do filme, enquanto a morte dos negros não é contada, mostrando o grande desprezo dos colonizadores pelos colonizados. A trama gira em torno de um chefe de polícia francês desajeitado que não possui o respeito de ninguém da aldeia. Nem sua mulher, nem os cafetões, nem os colonos o respeitam. Até que um dia, ele resolve se vingar, transformando-se num frio assassino. Foi minha primeira experiência com o cinema de Tavernier, mas talvez tenha sido uma escolha ruim para fazer um debut. A história é contada de forma estranha e distanciada. O filme se desenrola e, em nenhum momento realmente acreditamos que aquelas figuras existem e que aquilo possa, de fato, estar acontecendo. Era um filme que prometia, mas que se apresentou arrastado e cansativo. Uma pena, quem sabe da próxima vez dou mais sorte.