12.5.24

“Asteroid City” - Wes Anderson (EUA, 2022)

Sinopse:
Década de 1950. Em uma cidade fictícia do deserto norte-americano acontece uma convenção que reúne jovens prodígios e que tem por objetivo celebrar a queda de um meteorito na região há milhares de anos. Entretanto, a convenção é interrompida pela súbita aparição de um alienígena. Para que a história não vaze, o Exército resolve manter todos isolados na cidade.
Comentário: Wes Anderson (1969) é um cineasta americano, produtor, roteirista e ator. Seus filmes são conhecidos pelos seus visuais excêntricos e pelo estilo de narrativa. Já assisti dele a obra-prima "O Grande Hotel Budapeste" (2013), os excelentes "Os Excêntricos Tenenbaums" (2001), "A Vida Marinha com Steve Zissou" (2004), "Moonrise Kingdom" (2012) e “A Crônica Francesa” (2021), o bom "Viagem a Darjeeling" (2007) e as ótimas animações "O Fantástico Sr. Raposo" (2009) e "Ilha dos Cachorros" (2018).
Wes Anderson concedeu uma entrevista ao portal The Daily Beast na qual ele declarou que “Asteroid City” era algo sobre o qual Roman Coppola, que ajudou a escrever a história inicial, e ele estavam conversando. Ele declarou que durante muito tempo ele pensou em fazer algo que tivesse a ver com o teatro na cidade de Nova York quando ele estava no auge, em seu último momento de ouro, que teria sido a época do Actors Studio e da Broadway. Então os anos 1950 e anteriores quando o cinema utilizava o widescreen do Cinemascope mostrando desertos era um outro ponto a ser abordado. Outra coisa que já era certa era a de fazer algo com o ator Jason Schwartzman no centro da trama. Foi desse mix de ideias que surgiu o roteiro.
Maria Clara Vaiano (com edição de Luiza Monteiro) da Revista Galileu nos conta que o filme tem três paralelos com a vida real. A primeira correlação que ela cita é da quarentena imposta pelo Covid-19. Ela diz: “Após a aparição de um alienígena na cidade, a população de ‘Asteroid City’ é colocada em quarentena pelas Forças Armadas dos Estados Unidos. A restrição dura duas semanas e ninguém pode ter contato com outras pessoas. Na estreia do filme (...) Wes Anderson confirmou que há uma ligação entre a quarentena de Covid-19 com a quarentena imposta à população fictícia do longa. ‘Estávamos em um bloqueio e, de repente, começamos a escrever que eles [os personagens] estavam em quarentena. Nós nem questionamos isso, apenas parecia natural’, disse o diretor”.
A segunda correlação diz respeito às crateras urbanas que, de fato, existem. Ela diz: “Assim como em ‘Asteroid City’, há centros urbanos da vida real atingidos por objetos espaciais que deixaram sua marca no nosso planeta. Um exemplo é Winslow, no estado do Arizona, nos EUA, que abriga a Cratera de Barringer”.
E a terceira correlação que ela cita é que de fato existem no planeta cidades fantasma como a do filme. Ela diz: “Uma pequena cidade, no meio do nada, com apenas alguns habitantes e que conta com um centro de experimentos científicos. ‘Asteroid City’ não costuma receber visitantes, o que torna o cenário pacato ideal para testes de bombas atômicas, por exemplo. E existem lugares assim. É o caso da antiga cidade secreta de Ozyorsk, na Rússia”.
No elenco estão Jason Schwartzman, Scarlett Johansson, Tom Hanks, Tilda Swinton, Edward Norton, Adrien Brody, Willem Dafoe, Margot Robbie e Jeff Goldblum, dentre outros.
O que disse a crítica: Daniel Medeiros da Folha de Pernambuco não gostou. Escreveu: “’Asteroid City’ é um filme estranho - como costumam ser todos os trabalhos de Wes Anderson. Não deve agradar a um público mais amplo, mas tem o potencial de fazer bonito diante dos fãs do diretor. Visualmente atraente e inventivo na sua forma, o longa parece se perder no desejo do cineasta de elevar à máxima potência suas premissas cinematográficas. É uma experiência estética de fazer encher os olhos, mas cujo conteúdo deixa muito a desejar”.
Marcelo Hessel do site Omelete avaliou com 5 estrelas, ou seja, obra-prima. Disse: “Anderson engloba em ‘Asteroid City’ algumas pedras fundamentais de como a arte deu forma ao imaginário: o cinema, o teatro, a publicidade e a literatura. A maioria dos filmes tombaria sob o peso dessas pretensões caso as abraçasse. ‘Asteroid City’ evita essa armadilha”. Ele se supera, “reforçando a crença no seu cinema de casa de bonecas, reminiscente de uma certa inocência, onde o deserto dos testes nucleares é o lar do Papa-Léguas e o cogumelo atômico parece um efeito cartunesco de explosivo Acme; e ao mesmo tempo fazendo disso uma leitura política da maior sobriedade sobre um país, sua gente e suas escolhas”.
O que eu achei: Sabe aqueles filmes que tem a estrutura de uma boneca russa na qual você tem múltiplas camadas narrativas? O filme é bem por aí. A embalagem é o filme em si, chamado “Asteroid City”. Daí você abre essa primeira camada e se depara com o ator Bryan Cranston (o protagonista da série “Breaking Bad”), nos contando a história de um escritor (um dramaturgo vivido por Edward Norton) que está escrevendo uma peça de teatro. Após abrir essa segunda camada você se depara com a peça de teatro sendo encenada num ambiente semelhante ao deserto americano, cujos personagens vão nos contar a história que se passa na cidade fictícia Asteroid City, que leva esse nome porque no local há uma cratera gigantesca provocada pela queda de um meteoro. Além disso há uma quarta camada, filmada em P&B, que são os bastidores da encenação da peça. Essas camadas eventualmente se embaralham, não se separando tão claramente, afinal tudo faz parte de um filme, ou seja, é tudo uma grande encenação. Nem é preciso dizer que os cenários, os figurinos, a produção de arte como um todo, a fotografia em tons pastéis - que lembram um quadro do Edward Hopper -, a trilha sonora precisa do Alexandre Desplat, estão lá, reforçando o estilo habitual do diretor que eu, pessoalmente, ainda não enjoei. O curioso é que esse efeito de “cartola de mágico de onde não param de sair coisas”, aparece também nos diálogos rápidos e excessivos e no número de atores consagrados que vão entrando em cena, como Jason Schwartzman, Scarlett Johansson, Adrien Brody, Margot Robbie, Tom Hanks, Edward Norton, Steve Carell, Tilda Swinton, Jeff Goldblum, Willem Dafoe e o brasileiro Seu Jorge, dentre outros tantos. Essa overdose de elementos chega até a tirar um pouco a força do conteúdo (eu arriscaria dizer que ela é o conteúdo), então talvez não seja um filme interessante para quem vai assistir Wes Anderson pela primeira vez, mas quem já está habituado com o estilo do diretor vai perceber que o que ele fez pode ser encarado como uma espécie de aperfeiçoamento de si mesmo. O resultado é encantador. Se jogue.