21.4.24

“A Menina Silenciosa” - Colm Bairéad (Irlanda, 2022)

Sinopse:
Irlanda, 1981. Cáit (Catherine Clinch) é uma menina de 9 anos com uma família enorme e disfuncional. Como as condições financeiras da família não são nada boas e sua mãe está prestes a ter outro bebê, Cáit é mandada para a casa de parentes distantes: Seán (Andrew Bennett) e Eibhlín (Carrie Crowley). Apesar de nunca ter conhecido o casal de meia-idade, aos poucos, com a ajuda deles, Cáit consegue desabrochar e descobrir uma nova forma de viver - mas até mesmo nesta casa onde o carinho cresce e onde não existem segredos, ela descobre um.
Comentário: Colm Bairéad (1981) é um diretor de cinema e roteirista irlandês. Ele dirigiu três curtas, dois documentários, uma minissérie de tv e dois longas. “A Menina Silenciosa” (2022) é seu primeiro longa de ficção.
Alessandra Monterastelli da Folha SP nos conta que “O [filme] é uma adaptação do romance ‘Foster’, de Claire Keegan, um retrato da infância de uma criança introvertida, com dificuldades de entender o mundo dos adultos, que não sabem como expressar seus próprios sentimentos, vivendo infelizes”.
A história gira em torno de “Cáit, [uma menina] de 9 anos, [que] reage apenas com o silêncio à escassez e à família disfuncional. Sua retração é acompanhada por um olhar atento, guiado pelos imensos olhos azuis da atriz Catherine Clinch, que encaram as pessoas a sua volta como se quisessem interpretar seus comportamentos frios. Até que Cáit é deixada, sem muitas explicações, na fazenda [de parentes da mãe] para passar o verão. Assim inicia a trama (...) que acompanha a aproximação da menina de seus cuidadores temporários, um casal de meia-idade.
As lacunas entre diálogos, enquadramentos sobre gestos e o uso de câmera lenta parecem transmitir os sentimentos ainda em elaboração da personagem interpretada por Clinch, considerada por Bairéad o ponto gravitacional do filme. Ela foi escolhida para o papel após sete meses de tentativas”.
Segundo o diretor “A dificuldade de expressar os próprios sentimentos em palavras é algo ‘muito irlandês’. Temos dificuldade para articular emoções. Isso possivelmente tem alguma relação com o fato de termos sido colonizados. Usamos no filme a nossa língua nativa [o gaélico], que nosso colonizador tentou erradicar, então seu uso carrega um certo trauma”.
Segundo Monterastelli, “na década de 1980, quando se passa ‘A Menina Silenciosa’, a Irlanda vivia conflitos violentos no Norte do país. Enquanto parte da população era a favor de preservar os laços com o Reino Unido, responsável pela ocupação do território, outra parte exigia a independência da região ou sua integração com a República da Irlanda, região Sul, predominantemente católica. O filme não aborda o conflito diretamente, mas o referencia quando, por exemplo, faz o pai de Cáit, personagem autoritário e negligente, ser o único a falar inglês na trama - em um período em que o ensino da língua irlandesa havia sido proibido pelo Reino Unido. 'O silêncio foi parte da sociedade irlandesa em diferentes sentidos, mesmo depois de ganharmos nossa independência há cem anos’, diz Bairéad. ‘São raros os filmes irlandeses falados em língua nativa. Comercialmente não teria sido uma aposta esperta, o que se provou errado. É maravilhoso pensar que, enquanto uma nação que faz filmes, podemos escolher como nos expressamos’.
O filme foi rodado em Meath e Dublin, na Irlanda, mostrando a Irlanda rural da década de 80 do século XX.
O que disse a crítica: Victor Russo do site Filmes e Filmes avaliou com 3 estrelas, ou seja, bom. Escreveu: “A mesma simplicidade que dá uma doce ternura ao filme e nos direciona o olhar para os detalhes, não o permite ir muito além do lugar mais comum do filme com criança”. Segundo ele, “’A Menina Silenciosa’ se fortalece (...) por meio de sua simplicidade, desse foco nas pequenas coisas. Só que justamente essa falta de uma pretensão maior impede que o filme vá muito além daquilo que o gênero costuma fazer, caindo bastante naquela estética muitas vezes rotulada pejorativamente como ‘filme de festival’. Tem seu charme, consegue ser tocante pela sua ternura e doloroso pela falta de perspectiva de um futuro melhor, mas pouco tem de realmente marcante, para além da ótima atuação da talentosa Catherine Clinch”.
Ritter Fan do site Plano Crítico avaliou com 4,5 estrelas, ou seja, excelente. Ele disse: “Atores e atrizes mirins em suas estreias podem entregar atuações do tipo ‘uma vez na vida e nunca mais’ e, mesmo que esse acabe sendo o caso dela – e espero que não seja – o que ela consegue fazer é impressionante, o que repito ser mérito próprio dela em consonância com a capacidade do diretor de extrair esse trabalho inesquecível da menina. (...) O final (...) chega a ser uma obra-prima em sua enganosa simplicidade que, de quebra, ainda evita o melodrama barato. A menina quieta, quando fala, é a ternura encarnada”.
O que eu achei: A delicadeza do filme é desconcertante e absolutamente encantadora. O enredo diz muito contando pouco, o que parece compatível com a introspecção da personagem principal, a menina Cáit, interpretada lindamente pela atriz mirim Catherine Clinch. As falas são muito breves, mas carregam um subtexto claro que provoca um envolvimento emocional sem apelar para excessos sentimentais. A direção faz uma condução sensível, o elenco trabalha bem, a concepção visual do filme mostrando a Irlanda rural dos anos 1980, também é linda e a fotografia do filme é de encher os olhos. Um filme puro, honesto e tocante. Um poema em forma de filme.