7.9.23

“A Dama sem Camélias” - Michelangelo Antonioni (Itália, 1953)

Sinopse:
Clara Manni (Lucia Bosè), uma assistente de loja de Milão, assume o papel principal no drama romântico do produtor de filmes italiano Gianni Franchi (Andrea Checchi) e se torna famosa em Roma. No entanto, ela se vê presa em um mundo incrivelmente cruel de falsas promessas, relacionamentos fracassados e escolhas desastrosas.
Comentário: Michelangelo Antonioni (1912-2007) foi um diretor de cinema italiano de quem já assisti à obra-prima "Blow Up - Depois Daquele Beijo" (1966), ao excelente "Zabriskie Point" (1970), além de “A Aventura” (1960) e “Deserto Vermelho” (1964). Gabriel Carvalho do site Plano Crítico nos conta tratar-se do terceiro filme do diretor. Ele diz que “ainda em início de carreira, a qual duraria por muitos e muitos anos, o diretor busca com a obra retratar a figura da mulher no espaço cinematográfico, desenvolvendo seu argumento em cima das oportunidades que a indústria cede a ela. Em um ambiente extremamente sexista, o diretor mostra-se visionário, abordando já nos anos 50 um comentário extremamente atual sobre as mazelas que o capitalismo acaba causando, fruto de uma sociedade tão doente quanto os produtos que consome. Na premissa, Clara Manni (Lucia Bosé) é uma estrela em ascensão que um dia fora revelada pelo executivo de filmes Gianni (Andrea Checchi). Em mais uma empreitada na indústria de filmes italiana, testes revelam um maior interesse do público na figura da atriz do que nas peripécias do roteiro. Com o produtor Ercole (Gino Cervi) ciente de tal preferência, o investimento do estúdio passa a ser explorar, no marketing e no próprio longa-metragem, a imagem da mulher, tornando Clara tão produto quanto o próprio filme”. O título faz referência ao romance “A Dama das Camélias” de Alexandre Dumas.
O que disse a crítica: Carvalho avaliou como muito bom. Escreveu: “’A Dama Sem Camélias’ (...) exprime críticas à indústria cinematográfica e à exposição da mulher como produto a ser consumido nas telas. Ao final do longa, um diretor apresenta uma proposta por ele considerada ‘séria’ à Clara. Ela recusa-a por conter inúmeras cenas de sexo. Para ela o roteiro é apenas um pretexto para que ocorra esses segmentos. Considerada uma atriz lindíssima, se despir ou colocar-se em situações eróticas não seria uma parte fundamental do filme, na redefinição do corpo como arte, mas sim uma tática de mercado para atrair o público masculino. Se não consegue enfrentar essa corrente, infelizmente acaba por se unir, na esperança de um dia poder sair dela”.
O que eu achei: De fato, trata-se de um filme menor dentro da cinematografia do diretor. Títulos como “Blow-Up” (1966) e "Zabriskie Point" (1970) são infinitamente melhores. Esse é do início da carreira de Antonioni, então, apesar de bom, ainda carece de alguns ajustes para chegar ao patamar dos posteriores. A atriz principal, a linda Lucia Bosé, consegue transmitir as características de sua personagem muito bem, mostrando sua evolução como atriz. Li que o diretor Luchino Visconti a conheceu quando ela tinha 16 anos e trabalhava numa pastelaria. Ele que a convidou para trabalhar no cinema. Na trama ela é vendedora numa loja em Milão até que um diretor de cinema a vê e a convida para trabalhar no seu próximo filme. Então é fácil descobrir de onde veio a inspiração para rodar esse longa que trata da objetificação da mulher, algo que hoje ainda vivemos mas que nos anos 1950 era ainda pior. Essa pegada do sonho em ser atriz e das agruras da indústria cinematográfica me lembraram demais o filme “Belíssima” (1951) do Visconti, no qual a atriz Anna Magnani interpreta uma mãe que faz de tudo para que sua filha, a pequena Maria, torne-se estrela de cinema. A fotografia também é um ponto alto. A cópia que assisti estava restaurada e não havia como não prestar atenção à beleza dos tons de cinzas e aos enquadramentos precisos, alguns me lembraram fotos do grande Cartier Bresson. É um filme com diversas qualidades que vale ser visto.