
Comentário: Esmir Filho (1982) é um cineasta brasileiro. São dele os curtas "Alguma Coisa Assim" (2006), que ganhou o prêmio de Melhor Roteiro em Cannes, "Saliva" (2007), indicado para representar o Brasil no Oscar, a obra multimídia "Kollwitzstrasse 52", que combina cinema e teatro, exibida no MIS de São Paulo e o longa "Os Famosos e os Duendes da Morte" (2009). Em 2011, fundou a produtora Saliva Shots, onde desenvolve e produz conteúdo audiovisual para cinema, TV e internet. Assisti dele "Os Famosos e os Duendes da Morte" (2009) e desta vez vou conferir "Homem com H" (2025) uma cinebiografia do cantor Ney Matogrosso.
Vinícius Andrade do site Tangerina nos conta que "'Homem com H' tem sido elogiado por sua fidelidade aos fatos, uma condição inegociável imposta por Ney Matogrosso desde o início da produção. A principal exigência do cantor ao diretor e roteirista Esmir Filho foi clara. 'A primeira coisa que eu falei com o Esmir [Filho] foi que dizem muita coisa, escrevem muita coisa ao meu respeito que é loucura, que é mentira. Nesse filme não pode ter mentira, tudo que a gente colocar tem que ser verdade. E eu fiquei satisfeito quando assisti, porque tudo que está ali é verdade', disse o intérprete, durante entrevista de divulgação do longa.
(...) Para assegurar essa precisão, Ney Matogrosso teve um envolvimento significativo no processo de criação. Ele leu 12 versões diferentes do roteiro, das 17 que Esmir Filho preparou até a versão final. O cantor explicou que conferia os roteiros, não para proibir ou vetar, mas para assegurar a verdade. Além disso, ele visitou o set de gravações por um dia e teve uma sessão privada para ver o resultado final do filme. Segundo Esmir Filho, a contribuição de Ney foi 'brilhante' devido à sua 'ótima memória, revelando sentimentos e texturas'. (...)
A cinebiografia 'Homem com H' explora a trajetória de Ney Matogrosso desde sua infância em Bela Vista [cidade fronteira com o Paraguai em Mato Grosso do Sul], marcada por uma difícil relação com seu pai, que era militar, e pela violência homofóbica paterna. O filme também aborda a proteção de sua mãe, Beita. A produção acompanha o momento em que ele sai de casa, descobre a potência de sua 'voz fina', sua jornada com o grupo Secos e Molhados, sua carreira solo e seus relacionamentos.
Entre os amores retratados estão o com Cazuza (interpretado por Jullio Andrade/Jullio Reis) e com Marco de Maria (vivido por Bruno Montaleone), seu companheiro durante 13 anos. O filme mostra como Ney se liberta de opressões e figuras de autoridade, quebra preconceitos e se consagra como um dos artistas mais influentes de sua geração. O elenco inclui também Rômulo Braga, Hermila Guedes, Mauro Soares, Jeff Lyrio, Carol Abras, Lara Tremoroux e a cantora Céu.
Apesar de se considerar 'duro na queda' e não se descontrolar facilmente, Ney Matogrosso confessou que dois momentos na produção de 'Homem com H' o fizeram 'desabar' ou 'descontrolar'. A primeira vez foi ao assistir a uma cena durante as filmagens: 'era uma cena em que eu chegava para o Marco [de Maria, companheiro de longa data do cantor, que morreu em 1990, vítima das complicações causadas pela Aids], ele já doente, e mostrava o meu exame com o resultado negativo'. Ele descreveu a intensidade da experiência: 'Eu vi essa cena, e os atores estavam tão convincentes que senti uma coisa muito intensa'. Ney revelou que a cena o desestabilizou porque ele havia vivido aquilo e no momento se sentiu culpado, mesmo sem ter feito nada diferente e tendo certeza que estava contaminado, mas não contraiu a doença.
A segunda vez que se emocionou foi na primeira sessão privada do filme completo. No entanto, o artista brincou que, na segunda vez que assistiu ao filme, já estava 'vacinado', comendo pipoca enquanto todos ao redor choravam".
O que disse a crítica 1: Caio Coletti do site Omelete avaliou com 4 estrelas, ou seja, ótimo. Disse que "Homem com H" transmite grande sensibilidade, sobretudo na maneira como o diretor e seu parceiro de fotografia, Azul Serra, registram as performances musicais. Jesuíta Barbosa se entrega de forma notável à tarefa de traduzir a fisicalidade de Ney, dentro e fora do palco, de um modo que não apenas o evoca de forma convincente, mas também expressa uma dramaturgia sólida dentro do contexto específico do filme. Embora peque por não saber a hora de encerrar, "Homem com H" ainda conta uma bela história.
O que disse a crítica 2: Aline Pereira do site Adoro Cinema também avaliou com 4 estrelas. Escreveu: "Chama atenção o acabamento sofisticado dos figurinos, da caracterização dos personagens principais e a estética vibrante dos cenários - chega de passado esmaecido, como reforça o próprio diretor. É uma atmosfera que vai perto do lúdico e que penso que até poderia dar um passo além nesta direção. O ponto em que o longa perde força é justamente na linearidade quase que didática para expor os acontecimentos e, com isso, acaba se alongando em pontos que já estavam dados".
O que eu achei: "Homem com H" (2025) é uma cinebiografia que equilibra sensibilidade, risco e densidade emocional sem abrir mão de uma linguagem visual hipnotizante. A narrativa se estrutura em torno da jornada de vida do cantor Ney Matogrosso. Começa na sua infância e termina nos tempos atuais, com o artista se apresentando no Allianz em São Paulo em 2024. Nesse trajeto o que vemos é um protagonista que vive um processo de autodefinição – e o título, de aparência simples, logo se revela um poderoso jogo de espelhos. Esmir Filho não trata o “H” como mera letra ou símbolo identitário, mas como algo em permanente movimento, algo que o filme examina com afeto e ambiguidade. Há aqui uma força humana rara: o personagem é simultaneamente frágil e imenso, e o roteiro o acompanha sem julgamentos, explorando o que significa existir em um mundo que tenta fixar categorias. Visualmente, o filme é deslumbrante. A fotografia trabalha com contrastes de luz e textura que ampliam a sensação de interioridade, criando atmosferas que oscilam entre o documental e o onírico. Em vários momentos, vemos rostos e corpos como paisagens: cada gesto se torna narrativa, cada silêncio, uma revelação. A trilha sonora - usada com precisão, nunca em excesso - reforça o andamento emocional, envolvendo o espectador sem guiá-lo pela mão. O elenco entrega atuações vibrantes. A interpretação de Jesuíta Barbosa, que poderia virar caricata facilmente, dá conta do recado, sustentando nuances que poderiam se perder em mãos menos talentosas. A construção emocional é gradual, delicada, e quando o filme atinge seus pontos de maior intensidade, o impacto vem justamente do acúmulo de pequenas verdades que a direção soube cultivar. Além disso, "Homem com H" dialoga com temas contemporâneos de forma profunda, mas sem didatismo. O filme não quer explicar; quer fazer sentir. E é justamente essa confiança na potência da linguagem cinematográfica que o torna tão especial. O resultado é um retrato de identidade, desejo e pertencimento que amplia a tradição do cinema brasileiro voltado ao íntimo, mas com um frescor formal que lhe confere personalidade própria. Uma homenagem a altura de Ney Matogrosso. Tire as crianças da sala e se jogue.
Vinícius Andrade do site Tangerina nos conta que "'Homem com H' tem sido elogiado por sua fidelidade aos fatos, uma condição inegociável imposta por Ney Matogrosso desde o início da produção. A principal exigência do cantor ao diretor e roteirista Esmir Filho foi clara. 'A primeira coisa que eu falei com o Esmir [Filho] foi que dizem muita coisa, escrevem muita coisa ao meu respeito que é loucura, que é mentira. Nesse filme não pode ter mentira, tudo que a gente colocar tem que ser verdade. E eu fiquei satisfeito quando assisti, porque tudo que está ali é verdade', disse o intérprete, durante entrevista de divulgação do longa.
(...) Para assegurar essa precisão, Ney Matogrosso teve um envolvimento significativo no processo de criação. Ele leu 12 versões diferentes do roteiro, das 17 que Esmir Filho preparou até a versão final. O cantor explicou que conferia os roteiros, não para proibir ou vetar, mas para assegurar a verdade. Além disso, ele visitou o set de gravações por um dia e teve uma sessão privada para ver o resultado final do filme. Segundo Esmir Filho, a contribuição de Ney foi 'brilhante' devido à sua 'ótima memória, revelando sentimentos e texturas'. (...)
A cinebiografia 'Homem com H' explora a trajetória de Ney Matogrosso desde sua infância em Bela Vista [cidade fronteira com o Paraguai em Mato Grosso do Sul], marcada por uma difícil relação com seu pai, que era militar, e pela violência homofóbica paterna. O filme também aborda a proteção de sua mãe, Beita. A produção acompanha o momento em que ele sai de casa, descobre a potência de sua 'voz fina', sua jornada com o grupo Secos e Molhados, sua carreira solo e seus relacionamentos.
Entre os amores retratados estão o com Cazuza (interpretado por Jullio Andrade/Jullio Reis) e com Marco de Maria (vivido por Bruno Montaleone), seu companheiro durante 13 anos. O filme mostra como Ney se liberta de opressões e figuras de autoridade, quebra preconceitos e se consagra como um dos artistas mais influentes de sua geração. O elenco inclui também Rômulo Braga, Hermila Guedes, Mauro Soares, Jeff Lyrio, Carol Abras, Lara Tremoroux e a cantora Céu.
Apesar de se considerar 'duro na queda' e não se descontrolar facilmente, Ney Matogrosso confessou que dois momentos na produção de 'Homem com H' o fizeram 'desabar' ou 'descontrolar'. A primeira vez foi ao assistir a uma cena durante as filmagens: 'era uma cena em que eu chegava para o Marco [de Maria, companheiro de longa data do cantor, que morreu em 1990, vítima das complicações causadas pela Aids], ele já doente, e mostrava o meu exame com o resultado negativo'. Ele descreveu a intensidade da experiência: 'Eu vi essa cena, e os atores estavam tão convincentes que senti uma coisa muito intensa'. Ney revelou que a cena o desestabilizou porque ele havia vivido aquilo e no momento se sentiu culpado, mesmo sem ter feito nada diferente e tendo certeza que estava contaminado, mas não contraiu a doença.
A segunda vez que se emocionou foi na primeira sessão privada do filme completo. No entanto, o artista brincou que, na segunda vez que assistiu ao filme, já estava 'vacinado', comendo pipoca enquanto todos ao redor choravam".
O que disse a crítica 1: Caio Coletti do site Omelete avaliou com 4 estrelas, ou seja, ótimo. Disse que "Homem com H" transmite grande sensibilidade, sobretudo na maneira como o diretor e seu parceiro de fotografia, Azul Serra, registram as performances musicais. Jesuíta Barbosa se entrega de forma notável à tarefa de traduzir a fisicalidade de Ney, dentro e fora do palco, de um modo que não apenas o evoca de forma convincente, mas também expressa uma dramaturgia sólida dentro do contexto específico do filme. Embora peque por não saber a hora de encerrar, "Homem com H" ainda conta uma bela história.
O que disse a crítica 2: Aline Pereira do site Adoro Cinema também avaliou com 4 estrelas. Escreveu: "Chama atenção o acabamento sofisticado dos figurinos, da caracterização dos personagens principais e a estética vibrante dos cenários - chega de passado esmaecido, como reforça o próprio diretor. É uma atmosfera que vai perto do lúdico e que penso que até poderia dar um passo além nesta direção. O ponto em que o longa perde força é justamente na linearidade quase que didática para expor os acontecimentos e, com isso, acaba se alongando em pontos que já estavam dados".
O que eu achei: "Homem com H" (2025) é uma cinebiografia que equilibra sensibilidade, risco e densidade emocional sem abrir mão de uma linguagem visual hipnotizante. A narrativa se estrutura em torno da jornada de vida do cantor Ney Matogrosso. Começa na sua infância e termina nos tempos atuais, com o artista se apresentando no Allianz em São Paulo em 2024. Nesse trajeto o que vemos é um protagonista que vive um processo de autodefinição – e o título, de aparência simples, logo se revela um poderoso jogo de espelhos. Esmir Filho não trata o “H” como mera letra ou símbolo identitário, mas como algo em permanente movimento, algo que o filme examina com afeto e ambiguidade. Há aqui uma força humana rara: o personagem é simultaneamente frágil e imenso, e o roteiro o acompanha sem julgamentos, explorando o que significa existir em um mundo que tenta fixar categorias. Visualmente, o filme é deslumbrante. A fotografia trabalha com contrastes de luz e textura que ampliam a sensação de interioridade, criando atmosferas que oscilam entre o documental e o onírico. Em vários momentos, vemos rostos e corpos como paisagens: cada gesto se torna narrativa, cada silêncio, uma revelação. A trilha sonora - usada com precisão, nunca em excesso - reforça o andamento emocional, envolvendo o espectador sem guiá-lo pela mão. O elenco entrega atuações vibrantes. A interpretação de Jesuíta Barbosa, que poderia virar caricata facilmente, dá conta do recado, sustentando nuances que poderiam se perder em mãos menos talentosas. A construção emocional é gradual, delicada, e quando o filme atinge seus pontos de maior intensidade, o impacto vem justamente do acúmulo de pequenas verdades que a direção soube cultivar. Além disso, "Homem com H" dialoga com temas contemporâneos de forma profunda, mas sem didatismo. O filme não quer explicar; quer fazer sentir. E é justamente essa confiança na potência da linguagem cinematográfica que o torna tão especial. O resultado é um retrato de identidade, desejo e pertencimento que amplia a tradição do cinema brasileiro voltado ao íntimo, mas com um frescor formal que lhe confere personalidade própria. Uma homenagem a altura de Ney Matogrosso. Tire as crianças da sala e se jogue.