16.11.25

"Frankenstein" - Guillermo del Toro (EUA, 2025)

Sinopse:
O egocêntrico cientista Victor Frankenstein (Christian Convery / Oscar Isaac) resolve se aventurar em experimentos audaciosos e criar do zero uma criatura com vida (Jacob Elordi). O que essas tentativas e estudos desencadeiam é uma tragédia tanto para o criador quanto para sua criação monstruosa. Brincar de Deus levou Frankenstein a concretizar suas maiores ambições científicas, mas colocou-o na mira da raiva de sua própria criatura, que agora busca por vingança após se ver descartada pelo professor.
Comentário: Guillermo del Toro (1964) é um cineasta, roteirista e produtor mexicano. Assisti dele os bons "O Labirinto do Fauno" (2006), “A Forma da Água” (2017) e “O Beco do Pesadelo” (2021) e a animação “Pinocchio” (2022). Desta vez vou conferir "Frankenstein" (2025), baseado no livro homônimo de Mary Shelley publicado em 1818.
Angelo Cordeiro Silva da Revista Rolling Stone nos conta que "Guillermo del Toro sempre foi atraído pelos monstros - não apenas pelas criaturas fantásticas que habitam seus filmes, mas também pelos monstros que carregamos dentro de nós. Em obras como 'A Espinha do Diabo' (2001) e 'O Beco do Pesadelo' (2021), ele enxerga o horror nos homens e adota um tom amargo, quase desencantado, diante da crueldade humana. Já quando volta o olhar para o outro lado - para os seres rejeitados, deformados, incompreendidos - como em 'A Forma da Água' (2017), 'Pinóquio' (2022) e agora neste novo 'Frankenstein', o cineasta se deixa guiar pela ternura. É quando seus filmes se tornam cartas de amor às criaturas, lembrando que, no fundo, os verdadeiros monstros raramente são aqueles que parecem ser.
'Frankenstein' (...) apresenta Victor Frankenstein (Oscar Isaac), um cientista brilhante, porém egocêntrico, que dá vida a uma criatura em um experimento que acaba levando à ruína tanto o criador quanto sua própria criação.
Nesta nova adaptação do clássico de Mary Shelley, del Toro dá à história um romantismo gótico inconfundível, um deleite visual e emocional que reflete o carinho e o fascínio que o diretor tem pela criatura. É um filme não apenas sobre monstros, mas feito por alguém que os ama profundamente. E essa devoção se manifesta sobretudo na atuação hipnotizante de Jacob Elordi, que dá vida - e uma comovente humanidade - à criatura. Sua interpretação é contida e dolorosa, feita de gestos quebrados e olhares aflitos (...).
Del Toro transforma o clássico em uma fábula sobre o divino. O simbolismo é nítido: o 'brincar de Deus' é um tema constante, reforçado por referências bíblicas, como na sequência da leitura da história de Adão e Eva feita pela criatura, e também por sua pose em formato de cruz ao ser eletrocutado por raios e, posteriormente, ganhar vida. O monstro de Elordi é como um Jesus Cristo - um ser criado à imagem de seu criador, rejeitado pelo mundo, condenado por ser diferente. Há um eco de redenção e sofrimento, de amor e ira. O eterno conflito entre pai e filho se desdobra em camadas: primeiro entre Victor Frankenstein e seu próprio pai (Charles Dance), e depois entre Victor e a criatura - um reflexo trágico do mesmo amor distorcido que o criou.
Visualmente, 'Frankenstein' é o que se espera do cineasta mexicano. A Netflix deu a del Toro a liberdade e os recursos que ele merecia, e o resultado é um espetáculo que remete à opulência de 'A Colina Escarlate' (2015). Cada cenário é grandioso, decadente e belo, com suas sombras e luzes que parecem pulsar vida e, ao mesmo tempo, a morte - um espelho tanto do próprio Victor quanto da obsessão do próprio del Toro em dar forma ao inominável. A violência, por vezes chocante, nunca é gratuita. Ela se torna expressão dos males humanos e das feridas da criação. Quando a criatura se entrega à raiva, não é sua monstruosidade que transborda, mas sua humanidade. É o gesto mais humano possível: sofrer, amar e, por fim, destruir.
Muitos, inclusive o próprio del Toro e parte do elenco, como Mia Goth, chegaram a afirmar em entrevistas que 'Frankenstein' não é um filme de terror. E é possível compreendê-los, ao menos em parte. O filme nasce do terror, mas é também uma obra de fantasia, ficção científica e drama. Ainda assim, não há como negar: este é um filme de terror em sua essência, mas um terror banhado pela melancolia do romantismo gótico de Shelley ao qual del Toro dá vida como poucos conseguiriam fazer.
Del Toro cria aqui sua obra mais humana - e talvez a mais pessoal - desde 'A Forma da Água'. É o gesto de um homem apaixonado por tudo o que é imperfeito, que finalmente encontra em 'Frankenstein' a oportunidade de declarar esse amor. Porque, no fundo, o que é um diretor senão um criador obcecado em dar alma ao inanimado, em transformar dor em beleza, sombra em poesia? Se Victor Frankenstein ergueu um monstro, Guillermo del Toro escreve uma carta de amor no formato de um filme que pulsa com a ternura e a melancolia de quem acredita que até as criaturas merecem ser amadas. 'Frankenstein' é seu filho e sua confissão: a mais pura e comovente declaração de amor a uma criatura, dentre todas as que já ganharam vida a partir de suas obras".
No elenco, além de Oscar Isaac no papel de Victor Frankenstein e de Jacob Elordi no papel do monstro, temos Mia Goth no papel de Elizabeth e Christoph Waltz no papel de Henrich Harlander, um personagem que não existia no original de Mary Shelley. Na trama ele é um rico e inescrupuloso fabricante de armas que acumula fortuna durante a Guerra da Crimeia e que concorda em financiar os experimentos científicos de Victor Frankenstein, motivado por seus próprios interesses em reviver os mortos e talvez até mesmo aumentar sua própria vida e poder. Ele também é o tio de Elizabeth.
O que disse a crítica 1: Igor Gielow da Folha SP avaliou com 3 estrelas, ou seja, bom. Disse: "O diretor sofre um pouco da doença infantil do projeto pessoal, a excessiva reverência ao material de origem. Não que evite desvios: são muitos e, se Elizabeth (Mia Goth) e o novo papel para o irmão de Victor (Felix Kammerer) na trama funcionam, a introdução do personagem do cada dia mais careteiro Christoph Waltz é um erro. Mas a sensação deixada por Del Toro é a de temor de aprofundar mais radicalmente as inovações no enredo, o que acaba por realçar suas facetas mais convencionais. (...) Ao fim, ele entrega um filme de horror sem horror, a despeito do abundante 'body horror', na forma de uma bela declaração de amor a seu real protagonista - o monstro".
O que disse a crítica 2: Ritter Fan do site Plano Crítico avaliou com 4,5 estrelas, ou seja, excelente. Escreveu: "Com cenários práticos de fazer o queixo cair, especialmente os vários níveis da torre laboratório de Victor Frankenstein, um design de criatura inesquecível, que reúne o grotesco com o belo, uma história macabra, mas também sensível e emocionante e atuações irretocáveis de Oscar Isaac e Jacob Elordi, Guillermo del Toro finalmente materializou seu sonho e conseguiu dar vida à Frankenstein em um filme cheio de identidade própria, mas reverente ao material fonte, e que não esconde seu escopo e sua ambição. Um monstruoso triunfo gótico de visão única que espanta, assombra, encanta e enternece".
O que eu achei: Assistir ao "Frankenstein" (2025) de Guillermo del Toro me deu a mesma sensação de quando assisti “Nosferatu” (2024) de Robert Eggers: além do filme ter que competir com as inúmeras adaptações já feitas no cinema, o uso exagerado de CGI (Computer Generated Imagery ou Imagens Geradas por Computador) incomoda. Não que a técnica não tenha lá seus encantos. Ela tem. Cria cenários belíssimos, dá movimento quase reais a pessoas e animais, representa uma economia considerável em comparação ao que era no passado em que cada elemento precisava ser real e atende à imaginação sem limite dos cineastas. Até aí tudo ótimo. Entretanto seu uso excessivo acaba virando tipo uma sobremesa adocicada demais, daquelas que tinha tudo para ser gostosa, mas o excesso de açúcar acaba enjoando. Há muito de Guillermo del Toro no filme: os monstros que ele vira e mexe reverencia em suas tramas, a ideia de que o verdadeiro monstro é o ser humano e não o monstro em si, os cenários exuberantes e o cuidado notório com detalhes com figurinos, maquiagem, objetos de cena, etc. Mas há também muito de Netflix no filme, essa empresa que disse sim a um projeto que há décadas o cineasta pretendia fazer. Como já era de se esperar, eles dão o dinheiro – limitado obviamente – e fazem algumas exigências em troca. Eu desconheço quais exigências a Netflix pode ter feito, mas é notório como a trama é desenvolvida de forma excessivamente explicada, com tudo sendo dito com todas as letras, como se o público-alvo fossem pessoas que vêem filmes mexendo no celular. Outra coisa que chama a atenção é a semelhança do monstro – inspirado por uma estátua de São Bartolomeu situada na Catedral de Milão - com o visual pálido e brilhante dos vampiros da saga "Crepúsculo", muito diferente dos monstros interpretados por Boris Karloff em 1931 e do Robert De Niro em 1994. Com isso o filme não atinge aquela excelência que gostaríamos de ver, mas ele também não é de todo ruim. Tem qualidades na sua releitura do livro de Mary Shelley, trazendo para a história um apelo mais emocional, com o ator Jacob Elordi dando conta do recado num papel tão difícil – ser monstro sem ser caricato -, com a presença de personagens novos e um final emocionante que aborda a questão do perdão entre criador e criatura. Não creio que tenha cacife para abocanhar um Oscar de Melhor Filme na premiação de 2026, mas com certeza poderá concorrer em categorias mais técnicas como Edição, Fotografia, Direção de Arte, Figurino (as roupas e joias usadas pela Elizabeth inspiradas por insetos são maravilhosas), Maquiagem (a do monstro é mega bem feita), Trilha Sonora ou mesmo Roteiro Adaptado. Talvez não se torne um clássico, mas ainda assim configura uma boa distração, especialmente para quem não conhece a história ou nunca tenha visto nada do del Toro. Vamos ver agora o que a cineasta Maggie Gyllenhall fará com a história em "A Noiva!", que será lançado em 2026. A conferir.