13.1.24

“EO” - Jerzy Skolimowski (Polônia/Itália, 2022)

Sinopse:
EO é uma fábula que mostra a Europa contemporânea pelos olhos de um burro. Dotado de espírito curioso e olhar melancólico, ele vive como artista de circo antes de embarcar numa jornada que passa pela Itália e pela Polônia.
Comentário: O diretor Jerzy Skolimowski nasceu em 1938, em Lódz, na Polônia. Cineasta, roteirista, poeta, dramaturgo, pintor e ator, Skolimowski dirigiu cerca de 19 longas nos últimos 63 anos de carreira. Dentre seus filmes estão: “Le Départ” (1967), “The Shout” (1978), “Vivendo Cada Momento” (1982), “Quatro Noites com Anna” (2008) e “Essential Killing” (2011). “EO” é o primeiro filme que assisto do diretor.
O site do IMS nos conta que o filme “EO” - indicado ao Melhor Filme Internacional no Oscar e vencedor do Prêmio do Júri no Festival de Cannes - mostra o mundo visto pelos olhos de um animal. O site diz: “um burro cinza com olhos melancólicos, conhece pessoas boas e más ao longo do caminho. Após deixar o circo, faz uma jornada que vai da Polônia até a Itália, experimenta alegria e dor, transforma sua sorte em desastre, e seu desespero em uma inesperada felicidade. Mas nem por um momento ele perde sua inocência. ‘EO’ é uma homenagem do veterano diretor polonês Jerzy Skolimowski ao filme ‘A Grande Testemunha’ (Au Hasard Balthazar, 1966), de Robert Bresson: ‘Há décadas, eu disse em uma entrevista (acho que foi para a Cahiers du Cinéma) que o único filme que me levou às lágrimas foi ‘A Grande Testemunha’. Acho que o descobri logo após seu lançamento. Desde então, não derramei uma única lágrima no cinema. Assim, o que devo a Robert Bresson é ter adquirido a forte convicção de que fazer de um animal um personagem do filme não apenas é possível como pode ser uma fonte de emoção. (...) Os diretores usam argumentos intelectuais e linguagem emocional para provocar os atores a produzir o efeito desejado. Com o meu burro, a única forma de o persuadir a fazer qualquer coisa era com ternura: palavras sussurradas ao seu ouvido e algumas carícias amigas. Levantar a voz, mostrar impaciência ou nervosismo teria sido o caminho mais rápido para o desastre’, comenta o diretor sobre o trabalho com o animal. ‘Os burros têm uma natureza surpreendentemente idiossincrática. Cada um que empregamos tinha um caráter muito diferente, o que tornava a execução de cada tomada bastante imprevisível. Era como tentar resolver um quebra-cabeça todos os dias; tentando descobrir o que cada burro gosta, ou odeia, teme ou adora. (...) O estereótipo mais comum sobre os burros, o de que são teimosos, é verdade. Às vezes era mais fácil reorganizar uma cena, ou um movimento de câmera tão planejado, do que tentar convencer o burro a fazer algo que não queria fazer’.”
O título “EO” é o nome do burro e significa EU em polonês.
O que disse a crítica: Michel Gutwilen do site Plano Crítico avaliou como muito bom. Segundo ele, “parece incontornável trazer ‘A Grande Testemunha’, de Robert Bresson, para falar de ‘EO’, de Jerzy Skolimowski”. Sua resenha traça um paralelo entre os dois filmes e conclui: “Se o burro Balthazar era mudo, no máximo soltando seus grunhidos verossímeis, a sonoridade de EO é amplificada. Ao longo do filme, é quase como se ele tentasse se fazer escutado, comunicar-se com o mundo ao redor, gritando por socorro ao seu próprio modo, buscando ser ouvido pelos outros animais que ele encontra pelo caminho. Talvez, se nos fizemos surdos e cegos à causa animal este tempo todo, o que faz Skolimowski é abrir nossos olhos e ouvidos de uma maneira que não é possível ignorar mesmo tampando”.
Inácio Araújo da Folha SP avaliou como excelente. Ele nos alerta que “Skolimowski faz parte de um tempo em que um filme não se confundia obrigatoriamente com uma história - algo que cineastas orientais ainda cultivam; os ocidentais, muito raramente”. Ele diz: “Sua forma aceita o mistério e a opacidade, nos coloca diante do sentimento de estranheza que se desprende de suas imagens. É preciso encarar esse radicalismo para gostar deste filme. Quem fizer um esforço, no entanto, se verá diante de um espetáculo que impressiona não apenas pela beleza das imagens, mas pela diversidade dos sentidos que o autor vê na aventura da Terra, o que inclui homens e animais, mas também ventos, águas, paisagens, alimentação, os sons, a violência -tudo que passa pelo amplo quadro de significações contidas nas imagens. Quanto à violência, é exercida de maneira quase absoluta pelos humanos neste filme tão belo e tão enigmático”.
O que eu achei: Foi ótimo ter visto “A Grande Testemunha” (1966) de Robert Bresson antes de encarar o filme “EO” (2022) do polonês Jerzy Skolimowski, inspirado neste mais antigo. No primeiro o burro se chamava Balthazar, neste ele se chama EO que significa EU em português. Este novo é basicamente uma versão contemporânea e a cores do anterior que chama a atenção menos pelas inovações que traz e mais pela beleza das imagens que transformam o espetáculo visual numa espécie de trabalho de arte. A fotografia portanto é o ponto forte do remake, em especial as cenas filmadas em vermelho e preto. Se no filme do Bresson fiquei contente em ver a atriz Anna Wiazemsky em cena (aquela que foi casada com o Godard e que aparece no filme “A Chinesa”), desta vez a surpresa ficou por conta de ver Isabelle Hupert no papel da condessa. Os dois filmes meio que se equivalem, possuem poucas falas, poucos personagens, e contam basicamente a mesma história, mas se eu tivesse que eleger o melhor, fatalmente escolheria o filme do Bresson pela originalidade.