Sinopse: Século XVII. Um padre (Mieczysław Voit), é enviado para um convento a fim de investigar um surto de possessão demoníaca. Madre Joana (Lucyna Winnicka) afirma que tem oito demônios dentro dela. À medida que luta contra as forças das trevas, o padre é confrontado com a escolha de sacrificar sua própria pureza para salvar o convento do mal.
Comentário: Jerzy Kawalerowicz (1922-2007) foi um diretor de cinema polaco-ucraniano. Estreou na direção com o filme “Gromada” (1951). Em 1966 ele dirigiu “Faraó”, indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. “Madre Joana dos Anjos“ (1961) é o primeiro filme que vejo dele.
A história tem como base um conjunto de possessões demoníacas que supostamente ocorreram em Loudun, na França, em 1634, e que ficou conhecido como “A Possessão das Freiras de Loudun”. O filme baseou seu roteiro num conto escrito em 1946. Ele fazia parte de uma coletânea escrita por Jaroslaw Iwaszkiewicz, chamado “Novo Amor e Outras Histórias”.
Ines Paredes do site Comum Online nos conta que “’Madre Joana dos Anjos’ é considerada a primeira obra, na história do cinema, a retratar uma possessão demoníaca”. Segundo ela, “o cinema polaco testemunhara, durante os anos 50 e 60, os seus melhores momentos, e realizadores como Andrzej Wajda ofuscaram a genialidade de Jerzy Kawalerowicz. Portanto, é mais que oportuno rever esta obra desta figura-chave do cinema polaco.
O realizador polaco-ucraniano Jerzy Kawalerowicz lembra Bergman e Dreyer, ao contar a história de um padre que tem a missão de realizar exorcismos num convento de freiras. Polônia é um país marcado pelo catolicismo, e imaginar um filme sobre freiras possuídas por demônios na remota década de 60 é, no mínimo, polêmico. Kawalerowicz denuncia os horrores e a inumanidade do sistema de crenças católico, explorando o Homem que cria deuses e demônios para justificar os seus atos e as suas vontades. A narrativa é muito próxima aos filmes de Bergman e Dreyer, como já tinha referido, no sentido em que se sente a mesma angústia. Não há tortura física: o verdadeiro torturado, psicológica e emocionalmente, é o sacerdote que viveu num mosteiro desde criança e é atirado para o pior que o mundo exterior pode oferecer. A Madre Superiora espera-o, humilde, imaculada, filmada de costas. Quando mostra o rosto, pinta-se um quadro de Francis Bacon: provocação, perversidade, sabedoria, doçura, lê-se tudo isso nos olhos [da atriz] Lucyna Winnicka.
A arquitetura impressiona: o convento jaz numa colina solitária, numa Polônia fria; a cal das paredes contrasta com a escuridão dos espaços escondidos por trás dos arcos pronunciados; as salas são vastas, e aí o silêncio e a dúvida são palpáveis.
Kawalerowicz cruza o drama e o horror psicológico, desviando-se da espetacularização do tema da possessão demoníaca, condicionando-a à corrupção do coração humano, ao desejo sexual reprimido e à alienação austera do mundo”.
Uma curiosidade: essa mesma história foi filmada em 1971 por Ken Russell num filme chamado "Os Demônios", com Oliver Reed e Vanessa Redgrave, porém dizem que esta primeira versão é mais impressionante.
O filme ganhou o Prêmio de Júri no Festival de Cannes.
O que disse a crítica: Leonardo Campos do site Plano Crítico avaliou com 3,5 estrelas, ou seja, muito bom. Disse: “Por meio da oposição entre Deus e o Diabo, o filme reflete o aprisionamento dos demônios no corpo das freiras como uma metáfora para a mesma opressão que elas sofrem enquanto guardiãs de sentimentos inerentes aos seres humanos. Desejo sexual é um deles, sublimado por meio de orações constantes e autopunido quando manifestado até mesmo no pensamento. O corpo, utilizado como veículo para demonstração da fé, é banido de qualquer sensação que não seja o gozo espiritual”.
Inácio Araújo da Folha SP avaliou como ótimo. Escreveu: “A questão mais angustiante que se coloca ao [padre] exorcista vem do fato de que madre Joanna simplesmente não deseja que o diabo a abandone. O desejo é (...) o centro de tudo. É ele que parece estar na base da luta entre Deus e o Diabo, a que correspondem às tensões de espaço com as quais o diretor Jerzy Kawalerowicz joga tão habilmente e que potencializam o drama da pureza e da perversão que cada personagem carrega dentro de si. Porque estamos, não convém esquecer, na Polônia - um país onde o catolicismo é não só radical como, não raro, intolerante (e Kawalerowicz não deixa de notá-lo, ao introduzir a figura de um rabino, representado, não por acaso, pelo mesmo ator que faz o padre)”.
O que eu achei: Está aí um diretor polonês que eu não conhecia e que, segundo li, acabou ofuscado por realizadores contemporâneos à ele e que ganharam fama como Andrzej Wajda, por exemplo. O filme, além de esteticamente ousado, com uma pegada gráfica diferente e muito bem resolvida, é considerado o primeiro, na história do cinema, a retratar uma possessão demoníaca. Num país e numa época na qual o catolicismo era radical e intolerante, fazer um filme desse mostra a coragem do realizador, já que ele discute a ideia de que seja você padre, freira ou ateu, seu corpo com suas necessidades carnais estão ali para serem vividas e não demonizadas. A freira possuída não raro diz, no decorrer da trama, que ela não quer que o Diabo saia do seu corpo. Uma pena que Kawalerowicz não teve forças para se aguentar financeiramente fazendo filmes e acabou-se na TV. Mas que ele foi importante e que fez filmes provocadores, isso ele fez.
A história tem como base um conjunto de possessões demoníacas que supostamente ocorreram em Loudun, na França, em 1634, e que ficou conhecido como “A Possessão das Freiras de Loudun”. O filme baseou seu roteiro num conto escrito em 1946. Ele fazia parte de uma coletânea escrita por Jaroslaw Iwaszkiewicz, chamado “Novo Amor e Outras Histórias”.
Ines Paredes do site Comum Online nos conta que “’Madre Joana dos Anjos’ é considerada a primeira obra, na história do cinema, a retratar uma possessão demoníaca”. Segundo ela, “o cinema polaco testemunhara, durante os anos 50 e 60, os seus melhores momentos, e realizadores como Andrzej Wajda ofuscaram a genialidade de Jerzy Kawalerowicz. Portanto, é mais que oportuno rever esta obra desta figura-chave do cinema polaco.
O realizador polaco-ucraniano Jerzy Kawalerowicz lembra Bergman e Dreyer, ao contar a história de um padre que tem a missão de realizar exorcismos num convento de freiras. Polônia é um país marcado pelo catolicismo, e imaginar um filme sobre freiras possuídas por demônios na remota década de 60 é, no mínimo, polêmico. Kawalerowicz denuncia os horrores e a inumanidade do sistema de crenças católico, explorando o Homem que cria deuses e demônios para justificar os seus atos e as suas vontades. A narrativa é muito próxima aos filmes de Bergman e Dreyer, como já tinha referido, no sentido em que se sente a mesma angústia. Não há tortura física: o verdadeiro torturado, psicológica e emocionalmente, é o sacerdote que viveu num mosteiro desde criança e é atirado para o pior que o mundo exterior pode oferecer. A Madre Superiora espera-o, humilde, imaculada, filmada de costas. Quando mostra o rosto, pinta-se um quadro de Francis Bacon: provocação, perversidade, sabedoria, doçura, lê-se tudo isso nos olhos [da atriz] Lucyna Winnicka.
A arquitetura impressiona: o convento jaz numa colina solitária, numa Polônia fria; a cal das paredes contrasta com a escuridão dos espaços escondidos por trás dos arcos pronunciados; as salas são vastas, e aí o silêncio e a dúvida são palpáveis.
Kawalerowicz cruza o drama e o horror psicológico, desviando-se da espetacularização do tema da possessão demoníaca, condicionando-a à corrupção do coração humano, ao desejo sexual reprimido e à alienação austera do mundo”.
Uma curiosidade: essa mesma história foi filmada em 1971 por Ken Russell num filme chamado "Os Demônios", com Oliver Reed e Vanessa Redgrave, porém dizem que esta primeira versão é mais impressionante.
O filme ganhou o Prêmio de Júri no Festival de Cannes.
O que disse a crítica: Leonardo Campos do site Plano Crítico avaliou com 3,5 estrelas, ou seja, muito bom. Disse: “Por meio da oposição entre Deus e o Diabo, o filme reflete o aprisionamento dos demônios no corpo das freiras como uma metáfora para a mesma opressão que elas sofrem enquanto guardiãs de sentimentos inerentes aos seres humanos. Desejo sexual é um deles, sublimado por meio de orações constantes e autopunido quando manifestado até mesmo no pensamento. O corpo, utilizado como veículo para demonstração da fé, é banido de qualquer sensação que não seja o gozo espiritual”.
Inácio Araújo da Folha SP avaliou como ótimo. Escreveu: “A questão mais angustiante que se coloca ao [padre] exorcista vem do fato de que madre Joanna simplesmente não deseja que o diabo a abandone. O desejo é (...) o centro de tudo. É ele que parece estar na base da luta entre Deus e o Diabo, a que correspondem às tensões de espaço com as quais o diretor Jerzy Kawalerowicz joga tão habilmente e que potencializam o drama da pureza e da perversão que cada personagem carrega dentro de si. Porque estamos, não convém esquecer, na Polônia - um país onde o catolicismo é não só radical como, não raro, intolerante (e Kawalerowicz não deixa de notá-lo, ao introduzir a figura de um rabino, representado, não por acaso, pelo mesmo ator que faz o padre)”.
O que eu achei: Está aí um diretor polonês que eu não conhecia e que, segundo li, acabou ofuscado por realizadores contemporâneos à ele e que ganharam fama como Andrzej Wajda, por exemplo. O filme, além de esteticamente ousado, com uma pegada gráfica diferente e muito bem resolvida, é considerado o primeiro, na história do cinema, a retratar uma possessão demoníaca. Num país e numa época na qual o catolicismo era radical e intolerante, fazer um filme desse mostra a coragem do realizador, já que ele discute a ideia de que seja você padre, freira ou ateu, seu corpo com suas necessidades carnais estão ali para serem vividas e não demonizadas. A freira possuída não raro diz, no decorrer da trama, que ela não quer que o Diabo saia do seu corpo. Uma pena que Kawalerowicz não teve forças para se aguentar financeiramente fazendo filmes e acabou-se na TV. Mas que ele foi importante e que fez filmes provocadores, isso ele fez.